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Gustavo Morita / Revista Educação

Entrevistando crianças

Guia aborda questões como a necessidade de pedir autorização aos pais e cuidados com a reprodução de comentários postados em redes sociais

23/06/2016
Redação Jeduca
tenha em mente
- Entrevistar crianças é um componente crítico do trabalho do repórter de educação
- Nunca pressione crianças ou adolescentes a dar uma entrevista
- Práticas de aproximação e de evitar danos dependem do profissional

Entrevistar crianças é um componente crítico do trabalho do repórter de educação. No entanto, as práticas de aproximação, de evitar danos e constrangimentos variam dependendo do veículo e do profissional. Este guia visa fornecer a jornalistas orientações gerais, que devem ser vistas como sugestões baseadas no consenso de especialistas e em anos de experiência – não como regras imutáveis. Elas podem ser melhor resumidas pela máxima repetida pela professora da Escola de Jornalismo de Columbia LynNell Hancock na abertura do seu curso de jornalismo de educação: quando for cobrir crianças, primeiro não faça mal a elas.

 

Antes da entrevista

 

Use seu discernimento para avaliar se uma entrevista com uma criança requer autorização prévia dos pais, de professores ou funcionários da escola. Algumas abordagens podem se beneficiar de espontaneidade. Quando se trata de alunos do ensino fundamental, o aval só não é obrigatório quando o pai ou a mãe tiverem causado algum trauma à criança – aí a saída é recorrer a outro responsável. A autorização é necessária na maioria das entrevistas com pré-adolescentes. Com adolescentes, a decisão é mais caso a caso. (Nota da Jeduca: no contexto brasileiro, é preciso ter em mente que o Estatuto da Criança e do Adolescente, além de proibir a divulgação de nomes ou imagens de adolescentes ou crianças que cometeram algum ato infracional, também estabelece o direito à privacidade, prezando pelo respeito pela intimidade. Portanto, também no contexto brasileiro, a autorização do responsável e o cuidado em não expor a criança a uma situação que lhe traga prejuízo é essencial na elaboração de uma reportagem)

 

Para os mais velhos, a necessidade de envolver os pais aumenta se a história abordar questões sensíveis e houver risco de o jovem sofrer críticas por causa de suas declarações. Em geral, você pode ficar menos preocupado, por exemplo, para ouvir adolescentes sobre mudanças nos horários de aula ou na merenda sem consultar suas famílias. Mas precisa pedir permissão (ou, pelo menos, avisar os pais) antes de citar menores de idade sobre experiências com uso de drogas, bullying ou baixo desempenho escolar.

 

As normas escolares quanto a entrevistas variam bastante: algumas escolas pedem aos pais que assinem autorizações para divulgações na imprensa logo no início do ano. Outras não têm nenhuma política. Informe-se a respeito antes de procurar os estudantes. Também é preciso conhecer as leis sobre acesso a escolas e alunos. As regras podem variar de acordo com a cidade ou até mesmo dentro da rede municipal. Se houver restrições ao seu trabalho, procure o Conselho Escolar. (Nota da Jeduca: no contexto brasileiro, além de conselhos escolares, os juizados da infância e os conselhos tutelares também podem ser acessados nesse caso).

 

Nunca pressione uma criança ou adolescente a dar uma entrevista. Faça um esforço extra ao explicar a reportagem: diga quem você é, para qual veículo trabalha e qual o alcance dele, descreva a pauta detalhadamente. Diga às crianças que não há problema em recusar a entrevista.

 

Durante a entrevista

 

Crianças com mais de 10 anos devem decidir onde e quando serão entrevistadas. No caso das mais novas, a decisão cabe aos pais ou professores. Não se oponha se elas quiserem ter a companhia de outro adulto ou de um amigo. Se preferirem ser entrevistadas sozinhas, ache um local que não seja muito isolado para que elas não se sintam desconfortáveis ou intimidadas.

 

Deixe claro para os alunos que eles não têm de responder a todas as perguntas e a entrevista pode ser interrompida a qualquer momento. Para os mais velhos, pode ser útil dar uma lição rápida do que é “on” e “off”. Para os do ensino fundamental, basta dizer que eles podem pular perguntas ou decidir depois o que querem que entre ou não na reportagem.

 

Após a entrevista

 

Antes de ir embora ou desligar o telefone, assegure-se de que tem como localizar os pais do entrevistado ou seus responsáveis. Deixe seus contatos e explique que a família pode procurá-lo no caso de dúvidas ou preocupações.

 

Seja mais tolerante com as crianças do que seria com adultos, permitindo que mudem declarações ou revisem reportagens antes de serem publicadas. A maioria dos repórteres não permitiria a um agente público alterar ou excluir afirmações polêmicas, mas isso é mais aceitável com as crianças, que podem não perceber imediatamente o que está em jogo quando aceitam falar com a imprensa. Embora não seja obrigatório mostrar sua reportagem previamente, garanta que elas saibam de que forma serão retratadas.

 

Seja flexível quanto a reproduzir o nome completo de uma criança ou adolescente em histórias mais delicadas, publicando apenas o prenome ou preservando totalmente sua identidade. Mesmo que a criança e os pais concordem que ela seja identificada, é preciso avaliar se a divulgação do nome ou de certos detalhes não vai causar riscos ou constrangimentos. Em tais casos, o mínimo a fazer é procurar de novo a família para expor sua opinião e avaliar seriamente a hipótese de excluir certas informações.

 

Dicas

 

Use linguagem apropriada à idade, mas não menospreze a criança.

 

Não generalize. Não há apenas uma maneira certa de entrevistar crianças. Por exemplo, algumas se abrem mais quando estão em grupo. Outras, quando estão sozinhas com o jornalista.

 

Não se preocupe se um pai ou uma mãe estiver receoso com a entrevista. Se você é respeitoso e sincero, geralmente ganhará a confiança da família.

 

Se tiver dificuldades em fazer a criança falar, comece perguntando sobre os hobbies dela, mesmo que não sejam importantes para a reportagem.

 

Perguntas específicas como “Me dê um exemplo de outra situação em que você se sentiu dessa forma” são geralmente mais eficazes do que um mero “Por quê?”

 

Redes sociais e crianças

 

Facebook, Twitter e outras redes sociais podem ser úteis para pensar em pautas, fazer contato com estudantes e saber mais sobre suas vidas. Mas você deve evitar fazer entrevistas através dessas redes. Informações fornecidas online podem ser facilmente falsificadas ou manipuladas e muitos menores de idade (e muitos adultos) não compreendem completamente a natureza pública de um post.

 

São raros os casos em que cabe reproduzir posts de crianças – como, por exemplo, comentários sobre um colega ou professor que morreu. De qualquer forma, só identifique a autoria dos comentários depois de checar sua autenticidade e receber permissão para isso.

 

Se você escreve regularmente sobre questões da juventude, verifique se o seu veículo tem políticas ou protocolos para comentários em textos sobre crianças e adolescentes. Caso contrário, pense seriamente em pedir que eles sejam monitorados e, quando forem agressivos, excluídos.

 

Se o veículo não estiver disposto a fazer esse monitoramento, explique às famílias e crianças que as matérias serão publicadas online e ficarão sujeitas a comentários. De qualquer forma, certifique-se de que as crianças entendam que as publicações sobre elas podem circular indefinidamente na internet.

 

Entrevistar crianças em situação vulnerável

 

Pegar depoimentos de crianças que tenham enfrentado alguma violência, a morte inesperada de pessoas próximas ou outra forma de trauma exige extremo cuidado. Em geral, o melhor é esperar até que elas estejam em um ambiente seguro com os pais ou outro adulto de confiança e tenham tido tempo para processar os acontecimentos. No entanto, se você decidir que é necessário fazer a entrevista logo após um evento traumático, eis algumas diretrizes a considerar:

 

1) Peça a permissão e presença dos pais ou de um adulto de confiança, o que não elimina a necessidade de avaliar potenciais danos da entrevista. Mesmo os responsáveis pela criança podem estar abalados, incapazes de defendê-la. Nesse caso, redobre a cautela e pense seriamente na possibilidade de adiar a conversa.

 

2) Encontre um local seguro e tranquilo e seja paciente. Certifique-se de que o entrevistado e os pais entendam onde e quando a reportagem será publicada. Interrompa a conversa imediatamente se a criança ficar agitada ou com medo. Jornalistas que dão às famílias tempo e espaço para processar eventos traumáticos geralmente conseguem uma história muito mais forte e completa.

 

3) Tome cuidado extra com perguntas. Se elas forem muito diretas, podem causar confusão, dor ou stress. Por exemplo, em vez de dizer “Você sentiu medo quando o homem puxou a arma?”, considere perguntar: “Como você se sentiu com o que aconteceu?”

 

4) Cheque as informações. Qualquer entrevistado tende a confundir detalhes em situações de stress e crianças são particularmente sugestionáveis. Tome cuidado para não confrontá-las durante a entrevista. Mas confira os dados com outras fontes depois.

 

 Traduzido e republicado com permissão da EWA (Education Writers Association). O material original, em inglês, pode ser acessado aqui. 

 

*Para escrever  este guia Sarah Carr teve a consultoria da professora da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia LynNell Hancock, do jornalista do USA Today Education e diretor da EWA Greg Toppo, da jornalista do Hechinger Report Sarah Garland, do Dart Center para Jornalismo e Trauma e da editora pública da EWA Emily Richmond.

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