Em entrevista coletiva a associados da JEDUCA, Eduardo Deschamps, que presidente da Comissão Bicameral da BNCC do CNE (Conselho Nacional de Educação), conversou com jornalistas sobre desafios e desdobramentos envolvidos na implementação da Base do ensino médio, com o objetivo de esclarecer dúvidas.
O documento foi aprovado no CNE no início de dezembro, numa seção em que a pauta não foi anunciada com antecedência, como noticiou a Nova Escola, e homologado pelo MEC (Ministério da Educação) no último dia 18, confira no G1.
Com a oficialização da nova organização do ensino médio, o processo de implementação deverá ser semelhante ao que ocorreu com a educação infantil e o ensino fundamental: as redes de ensino vão começar a transformar a BNCC (Base Nacional Comum Curricular) em currículos.
No que diz respeito a currículo, o MEC (Ministério da Educação) está em fase final de elaboração de mais um documento orientador: os referenciais para a implementação dos itinerários formativos que passaram a integrar o ensino médio, informou o conselheiro. O fato de a BNCC do ensino médio não conter orientações para os itinerários havia sido alvo de críticas de um grupo de entidades tradicionais da área da educação.
Também vale acompanhar o impacto que a Base do ensino médio poderá ter em outras dimensões do funcionamento das redes de ensino e das escolas: além do currículo, a nova configuração do ensino médio deverá, também, influir nos regimes de contratação de professores e no financiamento. Isso ocorre por causa da nova configuração do ensino médio, que passou a ser dividido em um núcleo básico e cinco itinerários formativos optativos., segundo a lei 13.415 e as Diretrizes Curriculares do Ensino Médio.
Para acompanhar nos estados as discussões e decisões relacionadas ao ensino médio em 2019, é essencial ficar de olho nos concelhos estaduais, pois são as instâncias responsáveis por regulamentar o novo ensino médio nos estados.
Regime de contratação de professores
Como a nova legislação flexibiliza a maneira como os conteúdos das disciplinas - exceto língua portuguesa e matemática – podem ser ofertados, o novo arranjo deverá impactar no regime de contratação de professores, por exemplo.
De maneira geral, a contratação de professores está vinculada à quantidade de aulas que o profissional assume em uma ou em várias escolas. Como nem todos os conteúdos serão oferecidos necessariamente em aulas convencionais, é possível que as redes de ensino estabeleçam outras modalidades de contratação de docentes, especialmente nos itinerários formativos. Vale lembrar que a lei da reforma do ensino médio abre a possibilidade da contratação de professores com “notório saber”, o que será regulamentado pelos conselhos estaduais.
Esse é um aspecto que deve gerar negociações com sindicatos e tensões, embora as mudanças provavelmente não serão imediatas. De qualquer modo, a mídia deve ter isso em vista, na cobertura da formatação dos currículos do ensino médio, com o objetivo de esclarecer quais serão os arranjos que serão realizados para que as redes de ensino tenham professores em número suficiente. Também é preciso ficar atento ao perfil desses profissionais.
Financiamento
Outro ponto de atenção é o financiamento. A nova legislação abre a possibilidade de parcerias entre as redes públicas e organizações ou com o sistema privado para a oferta de componentes curriculares do ensino médio. Recursos do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação) podem ser usados para essas parcerias, o que também deverá envolver regulamentação em nível estadual.
Essa possiblidade não é nova, pois já existem redes de ensino que usam recursos do Fundeb para pagar, por exemplo, custos com consultorias para projetos em áreas como gestão, entre outras atividades. No entanto, no novo contexto, em que os arranjos e parcerias tendem a ser mais flexíveis, eles podem se intensificar e abranger atividades didáticas. Vale acompanhar quem serão os atores e entidades envolvidas, bem como os termos dessas parcerias e contratações.
A BNCC “pode tudo”?
Os impactos que a BNCC, em especial a do ensino médio, deverá ter sobre o regime de contratação de professores e o financiamento revela a centralidade que o currículo passou a ter na formatação das políticas para a educação básica. Um exemplo recente é a Base Nacional Comum da Formação de Professores, apresentada pelo MEC.
Um dos argumentos centrais para propor o novo formato para os cursos de formação de professores é o de que os professores precisam dominar os conteúdos e a didática para transmiti-los segundo as novas expectativas de aprendizagem, definidas pelas habilidades. Esta visão foi chamada de “praticista”, em manifesto da Anfope (Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação) e ForumDir (Fórum Nacional de Diretores de Faculdades/Centros/ Departamentos de Educação ou Equivalentes das Universidades Públicas Brasileiras).
Em contrapartida, há críticas ao caráter excessivamente teórico dos cursos de formação de professores e ao fato de ela ser descolada da realidade da escola, na avaliação dos formuladores do texto.
Confira também matéria publicada no portal do MEC sobre o assunto.