A ampliação de vagas nas creches e na pré-escola em um quadro de restrições orçamentárias é o grande desafio dos prefeitos que serão eleitos este ano. Essa é a opinião de uma das maiores especialistas em política educacional do País, Cleuza Repulho, ex-presidente da Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação) e ex-secretária de Educação de Santo André e de São Bernardo do Campo (SP), que participou no dia 25 de agosto do 1.º Webinário Jeduca, sobre a cobertura de educação nas eleições municipais.
Segundo Cleuza, a expectativa é de que 5 mil novos dirigentes assumam secretarias municipais de Educação depois das eleições. O desafio de ampliar vagas pode ser agravado com a possível aprovação da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 241, que limita os gastos públicos no setor a partir de 2017. A PEC, aliás, é só mais um exemplo de um quadro de conflito entre normas legais. "Vivemos uma esquizofrenia pública, porque a Lei de Responsabilidade Fiscal, que é anterior à expansão determinada pelo Plano Nacional de Educação, limita o investimento", disse. "E ainda temos perto de 600 mil crianças de 4 e 5 anos fora da escola. Isso não e mais possível, do ponto de vista legal."
Atender às demandas estabelecidas no Plano Nacional vai exigir vontade política. Cleuza lembrou que as creches, por exemplo, são equipamentos caros, com custos na casa de R$ 7 mil, R$ 8 mil anuais por aluno, mas os repasses federais para mantê-las ficam na casa dos R$ 4,5 mil. "Os prefeitos terão de enfrentar muita pressão do Ministério Público e das Varas da Infância."
Para os jornalistas que vão cobrir as eleições municipais, Cleuza recomendou desconfiar de projetos grandiosos. O ponto de partida de qualquer gestão responsável deve ser o Plano Municipal de Educação, já aprovado por 98% dos municípios brasileiros. "Os próximos prefeitos não devem inventar nada. Os planos já definem o que deve ser feito pelos próximos dez anos", disse. "Não adianta nada o candidato prometer investir no ensino médio, por exemplo, porque isso não é atribuição do município."
Pela legislação, as prefeituras são responsáveis pela educação da creche ao ensino fundamental. Esse é um aspecto básico a se levar em conta, já que a campanha nem bem começou e já há candidatos prometendo em debates investir no ensino médio profissionalizante.
Cleuza indicou algumas ferramentas para o acompanhamento das políticas municipais. A legislação prevê que as metas dos Planos Municipais de Educação estejam publicadas em portais. Os sites do MEC e da ONG Ação Educativa são fonte para o acompanhamento da execução dos planos.
Quanto ao diagnóstico da situação da educação nos municípios, Cleuza citou os sites do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, autarquia ligada ao MEC), que divulga indicadores educacionais por municípios e o Censo Escolar; do QEdu, base de dados públicos mantida pela Fundação Lemann; e o Observatório do PNE, coordenado pelo Todos Pela Educação, que faz o acompanhamento da execução do Plano Nacional. "Consultando essas fontes o jornalista não vai fazer feio na cobertura."
Para Cleuza, o mais importante durante a campanha é cobrar dos candidatos "compromisso com a escola pública de qualidade e para todos". O ideal é que esse compromisso seja feito por escrito. A Undime, por exemplo, criou uma Agenda da Primeira Infância, à qual qualquer candidato pode aderir.
"Esperamos que o webinário possa trazer subsídios que contribuam para a qualificação da cobertura da educação durante as eleições municipais", diz a jornalista Elisângela Fernandes, diretora da Jeduca e mediadora do webinário. "Trata-se de uma área complexa, por isso o jornalista precisa estar preparado para abordar o tema sob diferentes aspectos, como a questão econômica e financeira, a gestão pública, a qualidade do ensino, o enfrentamento das desigualdades, a transparência e o regime de colaboração com Estados e o governo federal, entre outros."