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Debates enfocam antirracismo, diversidade e impactos da covid-19

O 5.º Congresso Internacional de Jornalismo de Educação acontece em formato online de 27 de setembro a 1.º de outubro

27/09/2021
Vanessa Vieira, Especial para a Jeduca

As desigualdades educacionais ocasionadas pela pandemia de covid-19 e um bate-papo sobre escola, negritude e experiências pessoas com educação foram os pontos centrais do primeiro dia do 5.º Congresso Internacional de Jornalismo de Educação, promovido pela Jeduca.

 

O evento online e gratuito, que acontece até 1.º de outubro, tem como tema “A educação e as desigualdades na pandemia”. A programação completa pode ser conferida aqui. Caso tenha feito a inscrição, basta entrar no site com o login e senha cadastrada.

 

Confira a seguir, como foram os debates do primeiro dia do #Jeduca2021.

 

Encontro: Helio de La Peña e Pretinhas Leitoras

O congresso foi aberto com uma conversa sobre educação e negritude a partir de experiências pessoais do humorista Helio de La Peña e das gêmeas Helena e Eduarda Ferreira, do Pretinhas Leitoras, com mediação de Tatiana Vasconcellos.

 

Longe dos amigos e da escola desde o início da pandemia, Helena e Eduarda contaram que aprender se tornou um desafio. “A gente perdeu amigos, trocou de escola, não tem a mesma professora, a covid atrapalhou os estudos. A gente queria estar perto dos nossos amigos, queria ser criança”, disse Eduarda. “A pandemia atrapalhou e ainda atrapalha a nossa forma de estudar. A gente não teve o ensino desejado para usar as plataformas e tem muito colega que não sabe mexer na internet”, completou a irmã.

 

Único aluno negro no Colégio São Bento, no Rio de Janeiro, onde fez os anos finais do ginásio e do colegial (equivalente, respectivamente, aos anos finais do ensino fundamental e ao ensino médio) na década de 1960, Helio relatou que não se sentia como alvo de bullying racista, mas reconheceu que havia um desconforto. “Eu tinha a sensação de ter uma realidade diferente dos meus amigos, por ser preto, pobre e morar longe. O momento de desconforto acontecia quando a abolição da escravatura era abordada em sala de aula. Ali eu sentia que era a única pessoa que tinha vínculo com aquela história, a minha impressão era ‘ih, vão descobrir que eu sou preto’, como se isso não fosse evidente o tempo todo”, compartilhou.

 

Da mesma maneira, Helena e Duda ficam incomodadas quando o tema na aula é escravidão. “Pense numa coisa que eu odiava, era falar de escravidão. Me sentia constrangida”, disse Helena. “A gente via que tinha falta de estudo ali. As professoras só mostravam a cultura negra através do racismo, da escravidão e não sobre a luta para que as pessoas pretas pudessem pisar no chão hoje. A escola não mostra isso. O racismo está no olhar do professor, que está te encarando apenas por ser negro. A escola precisa melhorar bastante nisso”, complementou Duda.

 

Helio concorda: “A gente não aprende, na escola, a força que a nossa cultura e o nosso povo têm. Vai aprendendo depois na vida. Cabe à escola mudar. A gente sempre valoriza a educação, mas que educação é essa? O colégio tem que pensar mais sobre isso”, questionou.

 

Para ele, uma educação antirracista deve apresentar as evidências do racismo na sociedade, mostrar os motivos de existirem pessoas negras que são pobres, moram em favelas e de como isso aconteceu.

 

Quando se sentia “uma figura isolada” no Colégio São Bento, Helio recorria aos livros. Foi também na literatura que Helena e Eduarda encontraram refúgio da violência que as cercava em 2015, quando moravam no Morro da Providência, no Rio de Janeiro. “Eu queria ter a liberdade de ficar na rua, assim como todas as crianças. Foi crescendo a vontade de criar um canal [no YouTube] que falasse sobre isso, em que a gente discute a vida negra através da literatura, fala de histórias africanas”, explicou Helena sobre o início do projeto Pretinhas Leitoras, em 2018.

 

A iniciativa promove a discussão antirracista a partir do protagonismo negro, feminino e infantil através de diálogos mediados pela leitura negra. “Não é só mostrar o Monteiro Lobato, mas também outros escritores negros que fazem parte disso”, comentou Helena.

 

As gêmeas, prestes a comemorar o aniversário de 13 anos, desejam uma escola sem desigualdade, sem racismo, em que todos são tratados como pessoas normais, “como somos”. “Ia ter respeito pra todo mundo, ia contar histórias do povo negro antes da escravidão, uma biblioteca com livros sobre negros, indígenas…”, idealiza Helena.

 

Helio vai além: “Eu desejo uma escola que conseguisse capacitar as pessoas para que elas tivessem um papel importante na sociedade, independentemente de cor, de origem. A escola tem que deixar de ser um lugar que estuda a matéria para passar de ano”.

 

Desigualdades educacionais, Covid-19 e pós-pandemia

A segunda mesa do dia, com o tema “Desigualdades educacionais, Covid-19 e pós-pandemia”, girou em torno das estratégias para trazer de volta estudantes à escola, como as ações de busca ativa. Com mediação de Renata Cafardo, vice-presidente da Jeduca e repórter especial do jornal O Estado de S.Paulo, os convidados analisaram os impactos da pandemia na educação e projetaram as ações para mitigá-los.

 

Segundo Julia Ribeiro, oficial de Educação do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) no Brasil, a relação entre trabalho e escola sempre foi desafiadora. Pesquisas do Unicef indicam que, antes da pandemia, 62% dos alunos entre 4 e 17 anos que estavam fora da escola viviam em famílias com renda de até meio salário mínimo. “Esse cenário de desigualdade social cresceu e evidencia a importância de ações intersetoriais, que combatam as causas do abandono e da evasão escolar”, comentou.

 

Julia afirmou ainda que é preciso diálogo para garantir o engajamento dos estudantes, já que as causas do abandono envolvem aspectos ligados à escola (falta de vagas, desinteresse, falta de transporte e de acessibilidade física etc.) e motivos intersetoriais - desigualdade de renda, trabalho infantil, violência, racismo, bullying, exploração e abuso sexual.

 

Para Suelaine Carneiro, coordenadora de Educação e Pesquisa de Geledés Instituto da Mulher Negra, a integração de ações intersetoriais em que a família seja contemplada é fundamental. “Temos crianças que ficaram órfãs durante a pandemia. Se não pensarmos em ações conjuntas, do social dialogando com a educação, os jovens vão continuar assumindo tarefas que não são deles”, disse. Ela reconhece que o auxílio financeiro é importante, mas questiona: é uma medida permanente ou esporádica? “Em outras experiências, somente a bolsa no ensino médio não resolveu”, frisou.

 

No Pará, onde Lília Melo é professora de Língua Portuguesa, boa parte das famílias periféricas trabalha em espaços públicos, que foram fechados ou tiveram a circulação limitada por causa da pandemia. “Essas famílias ficaram sem renda para conseguir o almoço de hoje, tornando esse um problema prioritário. É interessante ter uma ação conjunta para suprir essa demanda financeira”, comentou.

 

A professora Lília também destaca que as escolas deveriam perceber que, quando o jovem faz um investimento em algo produtivo, como a pesca, esse conhecimento deve ser aproveitado. “Os saberes ancestrais dos povos tradicionais da Amazônia não são reconhecidos como um conhecimento científico. Por que não começamos a compreender que estudar não implica necessariamente no caderno e na caneta?”, questionou.

 

Esses relatos vão ao encontro da pesquisa “Juventudes e a Pandemia do Coronavírus”, coordenada pelo Conselho Nacional de Juventude, que detectou que a segunda maior preocupação do jovem brasileiro era com a renda familiar - atrás apenas da perda de algum parente. “Eu vejo como positiva a insatisfação dos jovens com os governos, fazendo tudo o que podem para ter acesso a direitos básicos. É o primeiro passo em busca de mudanças”, comentou Vitor Lauro Zanelatto, estudante de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Santa Catarina.

 

O jornalismo está atento às desigualdades?

E para responder a essa pergunta, participaram da terceira mesa do dia Irapuã Santana, procurador do Município de Mauá (SP) e advogado voluntário da Educafro; Jairo Marques, repórter especial de diversidade da Folha de S. Paulo; e João Silvério Trevisan, escritor e ativista na área de direitos humanos. A mesa foi mediada pela jornalista Yasmin Santos.

 

Irapuã Santana acredita que a discussão sobre desigualdades ainda não está disseminada na sociedade. “Às vezes ficamos discutindo algumas coisas que não entram no cotidiano das pessoas, mas acho que ainda existe um preconceito em relação a essas questões [racismo, capacitismo, LGBTfobia e isso fica estigmatizado como pauta de esquerda. São questões que deveriam ter uma preocupação de todos os espectros políticos”, afirmou.

 

Para Trevisan, que foi uma figura-chave na disseminação da pauta da diversidade sexual nos anos 1970, persiste a dificuldade de ampliar a discussão. “Muitas vezes, não conseguimos falar para um público mais amplo. Temos a tentação de falar uma linguagem cifrada e isso atrapalha bastante o diálogo mais amplo, mas não tenho a menor dúvida de que tem crescido e está se intensificando imensamente”.

 

Embora haja uma camada social fazendo pressão por visibilidade, por reconhecimento e por entendimento de direitos humanos, comentou Jairo Marques, a resposta a ela parece confusa. “Seja do marketing, do mercado de trabalho, da comunicação, às vezes [as respostas] são absolutamente marqueteiras”, comentou referindo-se, por exemplo, ao espaço que as pautas da diversidade conquistam na época de efemérides.

 

Trevisan concorda: “Hoje a mídia, especificamente o Jornalismo, está frequentemente vampirizando essas questões. A espetacularização acaba passando como um trator por cima das particularidades. Nós estamos sendo explorados para que a mídia se torne adequada ao seu tempo, para que pareça moderna. O jornalismo tende a fazer uma grave distorção da realidade, que pode parecer maravilhosa, mas deixa frutos ruins, deixa uma realidade a qual não pertencemos ainda”.

 

Para Irapuã, a melhoria desses aspectos passa por dois pontos: a inclusão efetiva das pessoas com talento, mas silenciadas, e a escuta efetiva desses atores. “Para desconstruir preconceitos, tem que ser uma batalha habitual, de inserção, de dar voz às pessoas. Não basta simplesmente receber a crítica e deixar para lá. Tem que escutar e colocar em prática, pesquisar para ter mais sensibilidade e simpatia para não cometer os mesmos erros que historicamente a gente vem cometendo”, disse.

 

O papel da comunicação, lembra Jairo Marques, é abrir espaço para o debate, dar voz. “Quando isso acontece, a gente vai direcionar as coisas para a defesa da vida, da democracia. Isso precisa ser um ponto calmo entre nós. Demos o momento para todos falarem. Depois disso, a gente precisa comunicar para o bem social”, concluiu.

 

O 5.º Congresso Internacional de Jornalismo de Educação conta com o patrocínio de Fundação Lemann, Fundação Telefonica Vivo, Instituto Unibanco, Itaú Social, Itaú Educação e Trabalho, e apoio do Colégio Rio Branco e Loures Consultoria.

 

 

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