No contexto de investidas à educação nos Estados Unidos, a quinta mesa do 9º Congresso Internacional de Jornalismo de Educação da Jeduca abordou os desafios das instituições educacionais para se defenderem de ataques e como o jornalismo e a educação podem fortalecer a democracia em um cenário em que a extrema direita tem ganhado espaço.
No primeiro dia do congresso, 25 de agosto, a mesa “Democracia em crise e a imprensa nesse cenário” reuniu Bianca Santana, colunista da Folha de S.Paulo e comentarista da TV Cultura, Marcelo Lins, jornalista paulista da GloboNews, o sociólogo Simon Schwartzman, e Beatriz Bulla, apresentadora da RedeTV! e do Amado Mundo, na mediação.
Da esquerda para direita estão Bianca Santana (Folha de S.Paulo e TV Cultura), Marcelo Lins (GloboNews), Simon Schwartzman (sociólogo) e Beatriz Bulla (Rede TV! e Amado Mundo), mediadora da sessão
Créditos: Tiago Queiroz/Jeduca
Citando como exemplo a guerra na Faixa de Gaza, Lins lembrou que as investidas contra a educação, enquanto parte de um plano político, não são um movimento exclusivo do governo Trump. “A educação, pode parecer que não, está em todos os cantos. Se pegarmos a tragédia que se aprofunda em Gaza por conta da ação militar israelense, um dos principais alvos dos ataques foram as universidades, quase nenhuma escola sobreviveu”, disse o jornalista.
“A educação é importante de ser destruída quando se quer quebrar a espinha de uma população”, disse Lins.
“Uma elite que não está preocupada com as questões cotidianas dos Estados Unidos, isso caiu como uma luva para o discurso radicalizado que quer achar culpados para problemas”, completou Lins, que enxerga o mesmo discurso antiuniversidade no Brasil e em outros países.
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Perguntado sobre como as universidades podem se fortalecer diante dos ataques de movimentos da extrema direita, Schwartzman indicou que elas precisam ter consciência dos próprios problemas, lidar com eles e comunicá-los com transparência à sociedade. Porém, o sociólogo também alertou que, muitas vezes, o jornalismo faz um retrato mistificado dessas instituições.
“Se a instituição não fizer o seu dever de casa e os meios de comunicação não derem um retrato fiel das universidades, da sua realidade, dilemas e da forma com que estão lidando com seus problemas, elas se tornam mais vulneráveis”, afirmou Schwartzman.
Sobre o reflexo das ações do presidente norte-americano no Brasil, ela afirmou que: “Tem embates de poder que o Trump explícita, ele afirma o racismo e sexismo sem meias palavras. Para uma parte da sociedade brasileira, que também compartilha desses valores, é um alívio ter governantes que explicitam uma ideologia sem precisar se esconder”.
A jornalista enfatizou que a educação é um campo de disputa de visões de mundo. Nesse sentido, ela acredita que “Também podemos aproveitar esse momento e explicar assuntos sem tantos véus”.
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Para Lins, dois desafios que os jornalistas enfrentam ao cobrir o governo Trump é lidar com a Flood the Zone (em tradução livre: “inundar a área"), a estratégia baseada na na criação de polêmicas diárias para direcionar a atenção dos críticos a temas superficiais e evitar que a cobertura de educação fique nichada.
“É dar uma quantidade de notícias em várias áreas, ataques coordenados, inclusive na educação, cobrir tudo é complexo. O segredo é achar onde está a interseção dessas iniciativas do governo”, disse o jornalista. “A educação precisa ser encarada com essa transversalidade, isso vale também no jornalismo, nos Estados Unidos e no Brasil”, completou.
Já Bianca chamou a atenção para a necessidade de lidarmos com a nossa própria realidade, olhando para problemas como a evasão escolar de jovens negros e como ela está relacionada aos indicadores de violência. De acordo com o Atlas da Violência 2024, de 2012 até 2022, uma pessoa negra foi assassinada no Brasil a cada 12 minutos. “A gente convive com esse dado como se ele fosse absolutamente natural”, refletiu a jornalista.
“Eu me sinto desconfortável de olhar e dar tanta atenção ao que o Trump fala ou faz, temos alguma ingerência sobre o que está no nosso quintal. As reportagens que produzimos podem ter alguma influência nesse cenário, podemos fazer as melhores análises sobre o que o Trump está fazendo nas universidades americanas, o nosso poder de influência é zero”, afirmou Bianca.
O 9º Congresso Internacional de Jornalismo de Educação da Jeduca conta com o patrocínio de Imaginable Futures, Instituto Unibanco, Fundação Bradesco, Fundação Lemann, Fundação Itaú, Arco Educação, Fundação Telefônica Vivo, Grupo Eureka, Instituto Ayrton Senna, Instituto Natura e Santillana Educação e apoio da Fecap, Instituto Sidarta, do Colégio Rio Branco e da Loures. Conta também com apoio institucional da Abej, Abraji, Ajor, Canal Futura, Coalizão em Defesa do Jornalismo e Instituto Palavra Aberta.