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Marcelo Camargo

Equidade é ponto de atenção na cobertura sobre escolas militares

Apresentado como alternativa para conter a violência e melhorar a aprendizagem, modelo cívico-militar pode colaborar para aumentar as desigualdades nos sistemas de ensino

26/02/2019
Marta Avancini

A proposta de aumentar o número de escolas militarizadas no país é uma das prioridades do governo Bolsonaro da área da educação  e envolve uma série de pontos que merecem a atenção do jornalista, sobretudo relacionados à qualidade e a à equidade da oferta de educação. Sem contar as interfaces desse debate com o financiamento e com a violência na escola, como detalhado nos tópicos a seguir.

 

Colégio militar x escola militarizada

 

Para qualificar a cobertura do tema, é preciso antes de tudo entender que não há um único modelo de escola militar no país.vNo Brasil, existem 13 colégios militares do Exército que atendem a filhos de militares e estudantes aprovados em processo seletivo. Essas escolas oferecem ensino fundamental e ensino médio e contam, todas juntas, com cerca de 15 mil alunos.

 

Uma diferença entre elas e colégios da rede pública estadual ou municipal é a cobrança de mensalidades. Em outubro do ano passado, o STF julgou a cobrança constitucional. Foi esse, inclusive, um dos argumentos que levou a USP (Universidade de São Paulo) a excluir alunos dessas instituições de sua política de cotas (a universidade depois voltou atrás).

 

As escolas públicas militarizadas são diferentes: trata-se de instituições de ensino que possuem gestão compartilhada entre as secretarias de Educação e de Segurança Pública. De maneira geral, a primeira se encarrega da parte pedagógica e a segunda, da gestão, especialmente da disciplina.

 

Diversas secretarias estaduais têm aderido a esse modelo. O caso mais conhecido é o de Goiás, que possui cerca de 50 escolas estaduais funcionando segundo este modelo.  A criação de escolas militares no estado remonta a 2001, mas ganhou impulso a partir de 2013.

 

O caso mais recente, que ganhou o noticiário, é o do Distrito Federal. Em janeiro, no contexto da posse do presidente Jair Bolsonaro, o governador Ibaneis Rocha (MDB) anunciou a transferência de quatro escolas à gestão da Secretaria de Segurança Pública já no ano letivo de 2019 no âmbito de um projeto-piloto, noticiou o Correio Braziliense.

 

No Brasil, existem cerca de 120 escolas públicas geridas por militares, segundo informa a Agência Brasil.  Além de Goiás e do Distrito Federal, esse modelo é adotado no Amapá, Mato Grosso, Piauí e Paraná, entre outros.

 

Por que militarizar a gestão de escolas

 

De maneira geral, são dois os argumentos usados para transferir a gestão de escolas públicas para a polícia militar ou para os bombeiros: a violência e a necessidade de melhorar o desempenho dos estudantes.

 

Uma das teses que sustentam esses projetos é a de que a adoção de regras mais rígidas e da disciplina acarreta num ambiente pacificado, no qual os estudantes passam a ter condição de se desenvolver adequadamente. De fato, há evidência de que a indisciplina prejudica o aprendizado, mas isto não significa que a única solução para o problema seja a adoção de regras rígidas de comportamento.

 

Para ampliar o foco da discussão, o jornalista de educação pode também mostrar que há exemplos de outras escolas que conseguiram amenizar o problema sem recorrer a regras tão rígidas. Entre pesquisadoras que já estudaram o tema estão Miriam Abramovay (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais) e Telma Vinhas (Universidade Estadual de Campinas).

 

Desempenho

 

Por sua vez, o argumento da melhoria do desempenho dos estudantes também precisa ser sempre contextualizado na cobertura. As escolas militares de fato aparecem entre as mais bem classificadas nas avaliações oficiais e no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), mas é preciso analisar esse resultado considerando o perfil de alunos que atendem.

Outras escolas com perfil de aluno semelhante, como mostrou reportagem recente da Folha de S. Paulo, apresentam resultados similares. Em geral, são colégios públicos que também adotam algum tipo de seleção na entrada dos alunos (algo que não acontece com a maioria das escolas municipais e estaduais), mas sem a disciplina militar.

 

O financiamento e a desigualdade em questão

Mais um aspecto a estar atento na cobertura é o financiamento. Reportagem do Estado de S.Paulo publicada em novembro aponta que um aluno de um colégio militar do Exército custa três vezes mais do que um estudante de escola pública – respectivamente, R$ 19 mil e R$ 6 mil ao ano. Cálculo feito pelo jornal revela que seria necessário triplicar o orçamento do MEC apenas para atender todos os estudantes de 11 a 17 anos neste modelo.

 

As indicações do MEC são de que haverá recursos para estados e municípios dispostos a aderir à iniciativa, além de um sistema de avaliação e acompanhamento das atividades nesses estabelecimentos, informa o site GaúchaZH, o que pode atrair as prefeituras e governos estaduais para o modelo. É improvável, contudo, que o modelo consiga se massificar, em função dos custos envolvidos. Nos estados onde o modelo já existe, as escolas contempladas recebem recursos adicionais da secretaria de Segurança Pública e melhorias da infraestrutura, como mostra essa reportagem do Fantástico no DF.

 

No entanto, um questionamento que surge é se a implantação de mais escolas militares no contexto das redes estaduais e municipais não gerará mais desigualdade entre as escolas, criando ilhas de excelência sem resolver o problema do sistema educacional como um todo.

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