Além de debates sobre educação e eleições, o 2º Congresso Internacional de Jornalismo de Educação terá atividades de formação. Das 28 mesas deste ano, quatro são para o profissional colocar a mão na massa. Com poucas vagas e muito interesse, são as primeiras a esgotar as inscrições. Duas das mais procuradas falam de jornalismo de dados, indispensável hoje para uma apuração precisa. Nas entrevistas a seguir, Raphael Kapa, que conduzirá a oficina "Fact-checking sobre educação - Especial Eleições", e Natália Mazotte, responsável pelo workshop "Como investigar grandes bases de dados de educação", contam um pouco do por que esses treinamentos são importantes.
Kapa, que foi repórter de educação e política, considera que saber transitar por bancos de dados pode fazer diferença para quem está envolvido ou vai se envolver na cobertura de uma campanha eleitoral. Ele participou, em 2015, da fundação da Agência Lupa.
Jeduca – Como surgiu a Agência Lupa?
Raphael Kapa - Foi no contexto da cobertura das eleições de 2014, quando surgiu o blog Preto no Branco no site do jornal O Globo. O blog foi o ponto de partida para a agência, que começou a funcionar no ano seguinte. Participei do grupo que fundou a Lupa e trabalhei na agência durante um período. Afastei-me para fazer um doutorado e, no ano passado, fui convidado para conduzir as oficinas da Lupa. Essa experiência e minha trajetória como repórter de educação demonstraram a importância de estar preparado para lidar com bancos de dados, especialmente no contexto das campanhas eleitorais.
Jeduca – De que maneira os dados podem ajudar um repórter no contexto da cobertura das eleições?
Raphael Kapa - A pauta da educação é forte no contexto das campanhas eleitorais. Nem sempre é o tema principal, mas é muito comum que políticos citem dados e informações relacionadas à educação quando falam sobre suas realizações ou em suas promessas. Por exemplo, citam números de escolas construídas ou quantidade de vagas oferecidas. Por isso, é importante que os jornalistas estejam preparados, saibam acessar e usar bases de dados para checar e filtrar essas declarações.
Jeduca – Qual o efeito da difusão do jornalismo de dados sobre a profissão? O acesso a grandes massas de dados mudou o jornalismo?
Raphael Kapa – A função do jornalismo é contar uma boa história. E isso permanece com o jornalismo de dados. Precisamos usar os dados a nosso favor para confirmar uma série de discursos que estão na rua. O uso de dados melhora as histórias que contamos.
A jornalista Natália Mazotte dirige a Open Knowledge Brasil, braço nacional de uma organização inglesa dedicada à defesa do aumento da transparência e do acesso à informação. Entre suas atividades está o programa Escola de Dados, voltado para a capacitação e formação nessa área. Para ela, o uso de dados é estratégico para o jornalismo.
Jeduca - Quais são os desafios envolvidos no uso de dados no jornalismo?
Natália Mazotte - Atualmente, existem muitos bancos de dados disponíveis. O desafio é usá-los. Os microdados fornecidos pelo Inep [Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais], por exemplo, contêm uma massa muito grande de informações, mas não é possível trabalhar esses dados em programas de planilhas convencionais, como Excel ou Google Sheets. Existe uma limitação técnica para quem não domina programação. Ensinamos um público que não sabe programar a tirar o melhor de técnicas básicas de programação para trabalhar com bases massivas.
Jeduca – Que técnicas são essas?
Natália Mazotte – Por exemplo, trabalhar na linha de comando para recortar e salvar a parte dos dados que interessa à sua análise. Ou trabalhar com SQLite no DB browser, que é uma linguagem relativamente simples, em uma interface de consulta mais palatável do que a "tela preta", que assusta quem não programa. Com esse tipo de recurso, o jornalista consegue lidar com bases de dados massivas sem ter um conhecimento aprofundado de programação.
Jeduca – Por que é importante que o jornalista saiba usar grandes bases de dados?
Natália Mazotte - Uma das funções do jornalismo é decodificar informações de interesse público para qualificar debates importantes para a sociedade em geral. Por isso, vejo como fundamental a ação da Escola de Dados no campo de formação desses profissionais e de outras organizações da sociedade civil.