De que maneira a desigualdade de gênero se manifesta na educação? Este é um tema presente em diversos levantamentos e estudos, que podem servir de subsídios para pautas no contexto do Dia Internacional da Mulher comemorado em 8 de março.
Um tema recorrente é o acesso à educação, essencial para o empoderamento das mulheres, afirmam especialistas. No Brasil, entre as mulheres, a escolaridade é maior que as dos homens e elas são maioria no ensino superior. Duas boas fontes para levantar esse tipo de informação são a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Municípios) e o Censo da Educação Superior, realizado anualmente pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais)
A Pnad Contínua de 2018, a mais recente, contém diversos tipos de dados sobre escolaridade, taxa de conclusão do ensino médio e taxa de analfabetismo, comparando homens e mulheres – por exemplo, as mulheres de 25 anos ou mais, por exemplo, estudam, em média, 9,5 anos, e os homens, 9 anos.
O Censo da Educação Superior indica o predomínio das mulheres entre os ingressantes (55% do total), matrículas (57%) e concluintes (61%) dos cursos de graduação, segundo dados de 2017.
O cenário parece, então, favorável às mulheres, mas o acesso à educação não é tudo; há outros aspectos que precisam ser levados em conta e vários indicadores revelam uma situação não tão favorável. Em 2018, 17,6% dos jovens de 15 a 29 anos não trabalhavam, nem estudavam, segundo a Pnad Contínua 2018. Entre as mulheres, 28,4% estavam nessa condição.
Um dos principais fatores que levam as jovens a abandonar os estudos é a gravidez na adolescência - pesquisa do Instituto Ayrton Senna de 2015 mostra que entre as adolescentes fora da escola (59% do total) 30% já eram mães. Um estudo do Banco Mundial de 2016 aponta que esta também é uma realidade em outras partes da América Latina, não apenas no Brasil.
Na publicação “Indicadores sociais das mulheres no Brasil”, de 2018, consta que o rendimento mensal médio das mulheres corresponde a 76% do dos homens – R $1.764 para elas e R$ 2.306 para eles. Ou seja, apesar de elas estudarem mais, elas ganham menos quando entram no mercado de trabalho.
Na mesma direção, a OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) concluiu, no relatório Education at Glance de 2019, que as brasileiras têm 34% mais chances do que os homens de se formar no ensino superior. No entanto, suas chances de conseguir um emprego são menores: a empregabilidade delas é de 82% e a deles, 89%.
Também é importante levar em conta as desigualdades por raça ou cor. Enquanto 23,5% das mulheres brancas com 25 anos ou mais têm ensino superior completo, 10,4% das mulheres pretas ou pardas atingem esse nível de escolaridade. Os dados são de 2016 e foram publicados nos “Indicadores sociais das mulheres do Brasil”.
O debate internacional
Assegurar o acesso das mulheres à educação, em condições de igualdade em relação aos homens, é tema de debate e mobilização em nível internacional. Um parâmetro para monitorar a equidade de gênero no acesso à educação é o ODS (Objetivo do Desenvolvimento Sustentável) 4: assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade até 2030.
O “Relatório de monitoramento global da educação 2018” da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) revela que a equidade de gênero diminui conforme aumenta a etapa: 34% dos países não alcançaram a paridade de gênero na educação primária (ensino fundamental 1) contra 75% dos países no ensino médio. Além disso, nos países mais ricos, a equidade tende a ser maior.
O estudo “A new era for girls” (“Uma nova era para as meninas”), do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), lançado este ano, aponta que em todo o mundo o número de meninas fora da escola diminuiu em 79 milhões entre 1998 e 2018. Apesar do avanço, ainda existem 130 milhões de meninas fora da escola do primário ao secundário (equivalente à educação básica no Brasil).
Frequentar uma escola não garante, necessariamente, que as meninas desenvolvam as habilidades necessárias para acompanhar as novas configurações do mercado de trabalho no século 21. Segundo o relatório “Full Force” (Força total) 1 bilhão de meninas em todo o mundo estão nesta condição, o que gera impactos para a economia global.
Gênero na escola
Outros aspectos sobre o tema também podem se transformar em pautas. A pesquisa Elas na Ciência, da Fundação Carlos Chagas e Instituto Unibanco, por exemplo, identificou a existência de estereótipos de gênero na educação.
Para 45,7% dos cerca de mil estudantes ensino médio entrevistados, alguns trabalhos só devem ser realizados por homens, 35,6% disseram que a mulher é mais capacitada para o trabalho doméstico e 22% pensam que as mulheres não são tão boas em matemática porque não se interessam pelo assunto.
Os estereótipos de gênero afetam as escolhas das carreiras e trajetórias profissinais das estudantes: por exemplo, as baixas expectativas dos professores sobre seu desempenho em matemática gera um desestímulo para elas seguirem carreiras nas áreas de exatas e tecnologia, segundo o Global Gender Gap Report 2017.
Esse tipo de resultado remete ao lugar das discussões de gênero no espaço escolar. No Brasil e em outros países da América Latina, movimentos como o Escola sem Partido e similares têm questionado o papel da escola enquanto lugar para abordar as questões ligadas à diferença e à diversidade. A Clade (Campanha Latino-Americana pelo Direito à Educação) acompanha esse debate em países como a Bolívia, Argentina e Peru.