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Relatório da Unesco mapeia desafios do uso da tecnologia na educação

Documento pode ser fonte de pauta sobre desigualdades de acesso à internet e equipamentos, riscos do uso não pautado por objetivos pedagógicos e potencial de inclusão de grupos minorizados, entre outros temas

27/07/2023
Marta Avancini

A Unesco lançou nesta quarta (26/7) o Relatório de Monitoramento Global da Educação de 2023, publicação anual que traça um panorama da educação no mundo. Pela primeira vez, o documento intitulado “A tecnologia na educação: uma ferramenta a serviço de quem?”, abordou esse tema.

 

Os dados e análises compilados no relatório podem ser um bom ponto de partida para pautas sobre a tecnologia na educação, em especial na escola, num cenário em que o MEC (Ministério da Educação) promete anunciar um programa de conectividade para as cerca de 138 mil escolas públicas.  

 

Um dos objetivos do programa é superar um dos principais desafios relacionados à tecnologia na escola: a desigualdade de acesso à internet. No Brasil elas são evidenciadas em vários tipos de recorte. Por exemplo, 62,3% das escolas públicas urbanas têm conexão de banda larga, enquanto nas escolas rurais, o índice é de 37,7%. Os dados são do Censo Escolar 2022 e processados pelo Nic.br.

 

Em nível mundial, cerca de 85% dos países têm legislação ou políticas para melhorar a conectividade nas escolas.

 

O relatório da Unesco, que é um braço da ONU (Organização das Nações Unidas) para a educação, afirma que, cada vez mais, o direito à educação é sinônimo de direito à conectividade adequada. Mas a desigualdade de acesso é um problema mundial: 40% das escolas primárias (equivalente ao ensino fundamental 1), 50% das escolas de primeiro nível da educação secundária (ensino fundamental 2) e 65% das escolas de segundo nível da educação secundária (ensino médio) estão conectadas à internet. Ou seja, uma grande parcela das escolas ainda não tem acesso à internet.

 

O resumo em portugués do relatório pode ser baixado aqui. O documento na íntegra, em inglês, está disponível aqui.

 

O uso do celular na sala de aula

Um dos dados mais destacados pela imprensa nacional e internacional foi a sinalização do relatório de que o celular em aula pode ter um impacto negativo se for utilizado de maneira inadequada ou excessiva

 

Dados de 14 países apontam que a proximidade de um smartphone na sala pode distrair os estudantes e impactar negativamente a aprendizagem, porque eles perdem o foco nas atividades escolares. 

 

Isso não significa que o uso de tecnologia não é recomendado e que a Unesco esteja sugerindo o banimento do celular nos ambientes escolares. A discussão é como e para que a tecnologia é utilizada; ela precisa estar alinhada com os processos pedagógicos e seu uso deve ser direcionado pelo professor, reforça o relatório.

 

Mesmo assim, vários países estão proibindo ou limitando a certos tipos de estudante o uso de celular em sala de aula, como noticiou o Estadão, o Metrópoles e jornais internacionais como The Guardian, na Inglaterra. 

 

Impactos da inteligência artificial

Os impactos da inteligência artificial na educação ainda são incipientes e são necessárias mais evidências para se entender como ela pode mudar a forma de aprender, diz a Unesco, aspecto destacado em outra matéria do Estadão

 

No entanto, é possível prever que essa tecnologia pode, de fato, substituir tarefas de ensino (como correção e cálculo de notas), levar à modificação de métodos de avaliação (já que os trabalhos escritos não indicam mais necessariamente o domínio de habilidades).

 

Com isso, o papel do professor e da escola mudam, buscando formas de ensinar e avaliar que deem conta de habilidades mais sofisticadas, como por exemplo o pensamento crítico

 

Um possível impacto negativo para a aprendizagem relacionado ao uso de ferramentas como o ChatGPT é levar ao desinteresse de estudantes para fazer pesquisas de forma independente e buscar suas próprias soluções, já que elas simplificam esses processos. 

 

O enfraquecimento da autonomia, do pensamento crítico, da curiosidade, entre outras habilidades, vai na contramão do mundo do trabalho contemporâneo, que exige competências complexas, já que as tarefas repetitivas estão cada vez mais automatizadas.

 

A inteligência artificial na educação também pode ampliar desigualdades, se as diferenças de ritmo e estilo de aprendizagem entre os estudantes não forem equacionadas pela escola.

 

Impacto na aprendizagem

O relatório sinaliza que a tecnologia pode melhorar alguns tipos de aprendizagem em alguns contextos, mas o simples acesso à internet e à tecnologia não trazem, obrigatoriamente, melhoria da aprendizagem. No Peru, por exemplo, foram distribuídos mais de 1 milhão de laptops para uso pedagógico, mas a aprendizagem não melhorou. 

 

Não basta assegurar acesso à internet ou a aparelhos, é preciso garantir que elas sejam incorporadas às atividades pedagógicas em alinhamento com as necessidades e objetivos estabelecidos pelos professores, sistemas de ensino etc, diz o relatório. Devem focar nos resultados e não nos recursos, como informa o Correio Braziliense.

 

A tecnologia pode ajudar a fortalecer a inclusão, acessibilidade e personalização para estudantes com deficiência, na medida em que removem barreiras de aprendizagem e comunicação. Mas, em muitos países, esses materiais são caros e, por isso, se tornam acessíveis a uma minoria.

 

Outro achado relevante é que a tecnologia não precisa ser sofisticada ou de ponta para surtir efeito. Na China, a distribuição de aulas gravadas a 100 milhões de estudantes rurais melhoraram seus resultados em 32% e diminuíram a desigualdade salarial entre populações urbanas e rurais em 38%.

 

O relatório também alerta para o fato de que existem poucas evidências sobre o valor agregado da tecnologia digital na educação e que muitas análises sobre seu impacto são feitas pelas empresas que oferecem os serviços.

 

Um dado de contexto relevante é que mesmo nos países mais ricos, o uso das tecnologias de informação na sala de aula não é elevado. Mas para isso são usados dados do Pisa 2018, coletados portanto antes da pandemia. Eles indivacam que em mais de 50 países, só 10% dos alunos de 15 anos ou mais usam aparelhos por mais de uma hora e meia por semana. 

 

Num cenário de avanço das tecnologias da informação, o desenvolvimento de habilidades digitais ganha importância. A definição do que são essas habilidades varia dependendo do país ou região, mas 46% dos países definiram padrões de habilidades digitais para os estudantes. Na União Europeia, por exemplo, são consideradas cinco áreas: alfabetização em informação e dados, comunicação e colaboração, criação de conteúdo digital, segurança e resolução de problemas.

 

O desenvolvimento dessas habilidades é desigual: em 2021, no Brasil, 31% dos adultos tinham habilidades básicas (o nível é duas vezes maior nas cidades do que no campo), enquanto que na União Européia, 54% estavam nessa condição.

 

Pontos de atenção para a cobertura

-  Ao abordar o tema da tecnologia nas escolas, procure saber se elas serão incorporadas à prática pedagógica.

 

- É importante deixar claro que a Unesco faz um relatório crítico em alguns pontos ao uso da tecnologia, mas não sugere proibição de nenhuma ferramenta ou equipamento

 

- Um aspecto fundamental é a habilidade do professor para lidar com a tecnologia. Procure identificar se há formações nessa área, como são oferecidas e que tipo de apoio os professores têm no dia a dia para usar a tecnologia. Vale levar em conta que 66% dos professores que atuam em escolas urbanas dizem não ter habilidade para usar tecnologia em tarefas educacionais. O dado é da pesquisa TIC Educação 2021, realizada pelo Cetic.

 

- A aplicação da tecnologia em recursos de acessibilidade para estudantes com deficiência é outra possibilidade de pauta. De maneira geral, esses materiais são disponibilizados nas salas de recursos multifuncionais, que estão presentes somente em 21,5% das escolas de  educação básica brasileiras. O dado é do Censo Escolar 2022  e foi processado pelo Instituto Rodrigo Mendes. 

 

- Considerar, sempre que possível, as desigualdades regionais, raciais, de gênero, entre outras, nas reportagens.

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