Nesta terça-feira (7/10), o Senado aprovou o Projeto de Lei Complementar 235/2019, que estabelece a criação do SNE (Sistema Nacional de Educação), de autoria do senador Flávio Arns (Podemos/PR). Agora, o texto segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Conhecido como o “SUS da Educação”, em referência ao Sistema Nacional de Saúde que possui uma estrutura de governança comum para todo o país, o SNE é uma demanda antiga do setor educacional. A sua criação está prevista no Art. 214 da Constituição Federal, assim como na lei nº 13.005, que instituiu o PNE 2014-2024. A Meta 20 do Plano, estratégia 20.9, previa um prazo de dois anos para a articulação do SNE.
A reta final da aprovação do SNE coincide com a tramitação do Projeto de Lei 2.614/2024, que cria o novo PNE (Plano Nacional de Educação) 2024-2034, que aguarda publicação de relatório da Comissão Especial na Câmara dos Deputados.
Os objetivos principais do SNE incluem promover a colaboração entre a União, estados e municípios, possibilitar a integração de políticas públicas e organizar como as diferentes esferas de poder deverão trabalhar na educação. Para entidades, parlamentares e especialistas, ele é considerado complementar ao PNE, sendo um avanço que pode favorecer o cumprimento das metas.
Além disso, a expectativa é que o SNE contribua para aprimorar as políticas de financiamento da educação, além de possibilitar avanços na integração de dados e informações, contribuindo para a formulação e implementação das políticas educacionais.
Histórico – O PLP 235/2019 foi protocolado em 2019 e aprovado no Senado em 2022. Em seguida, o texto foi encaminhado à Câmara dos Deputados, onde permaneceu por três anos, sendo aprovado no início de setembro de 2025, na forma de um substitutivo do relator, deputado Rafael Brito (MDB-AL). Depois, retornou ao Senado para nova votação, em regime de urgência.
O PLP 235/2019, que descreve a estrutura do SNE, prevê a criação de instâncias permanentes de pactuação federativa, que são:
As funções da Cite incluem estabelecer a assistência técnica e financeira da União e articular as estratégias para garantir o alcance das metas do PNE, formular a metodologia de cálculo do CAQ (Custo Aluno-Qualidade) e os parâmetros nacionais de qualidade da educação básica.
Um ponto de atenção é que, devido a autonomia federativa dos estados e municípios, prevista por lei, os pactos da Cite terão “caráter de orientação aos entes federados”, segundo explica matéria do Poder360.
Diferente do que ocorre no SUS, a comissão tripartite do SNE terá menos poder, conforme explica matéria do Estado de S.Paulo, uma vez que o texto prevê que estados e municípios não serão obrigados a aderir aos programas e políticas pactuados pela comissão.
Uma das novidades do novo texto é a criação do Inde (Infraestrutura Nacional de Dados da Educação), que terá o propósito de reunir informações de escolas e sistemas de ensino e garantir o compartilhamento, qualidade e segurança dos dados.
Como parte da Inde, o texto prevê o Inue (Identificador Nacional Único do Estudante), um identificador que visa criar um registro unificado da vida escolar do estudante, segundo explica matéria do g1.
A União, através do MEC (Ministério da Educação), será responsável pela organização e coordenação da Inde.
O identificador deverá conter dados sobre evasão, permanência, dificuldades de transporte, transferências de escola e grau de aprendizagem, por exemplo, que poderão servir para a criação de indicadores nacionais e regionais. Outra função do Inue é oferecer subsídios para que os educadores acompanhem o desempenho, desafios e dificuldades dos estudantes com mais atenção.
O CAQ (Custo Aluno-Qualidade), indicador que define o padrão de qualidade por aluno, é um dos principais pontos em debate no PLP 235/2019. O PNE 2014-2024, na estratégia 20.6, estabelecia o CAQ como parâmetro de financiamento da educação básica e previa sua implementação em até três anos — ou seja, até 2016 —, o que não ocorreu.
A PLP 235/2019 prevê que a Cite seja responsável por formular as diretrizes e metodologia para o cálculo do CAQ, que será calculado pelo MEC, e por estabelecer também diretrizes para que as Cibes calculem os CAQs estaduais.
Segundo o texto, o CAQ deverá ser aumentado progressivamente para assegurar o cumprimento das metas de financiamento do PNE e terá como referência os padrões mínimos de qualidade da educação básica, também formulados pela Cite.
Para especialista consultado em matéria do jornal O Globo, que considera o CAQ um ponto de preocupação no texto, é necessário levar em consideração a questão fiscal para garantir que a lei seja, de fato, aplicada e evitar que os municípios não consigam cumprir o que diz a legislação.
Em posicionamento, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação destaca a retirada do dispositivo que previa a complementação de recursos pela União aos entes que não alcançassem o CAQ. A ausência desse trecho, segundo a entidade, enfraquece o caráter redistributivo do SNE, podendo perpetuar desigualdades regionais.
Outra função da Cite será estabelecer um padrão mínimo de qualidade nacional, que assim como o CAQ, será obrigatório para estados e municípios. Ele deverá compreender as condições de oferta, rendimento escolar e as diferentes etapas e modalidades descritas na LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
O padrão irá considerar as seguintes dimensões:
Em posicionamento, o Todos Pela Educação destaca que, no texto aprovado pela Câmara, há carência de uma distinção clara entre os padrões mínimos de qualidade e o CAQ. Segundo a entidade, a formulação e revisão dos padrões de qualidade devem ser feitas com intervalo de tempo adequado, além de ser necessário promover um debate adequado para formulação da metodologia do CAQ.
O PLP 235/2019 propõe também a criação da Avaliação Nacional da Educação Básica, a ser coordenada pela União em colaboração com estados e municípios, abrangendo escolas públicas e privadas nas seguintes dimensões: gestão, infraestrutura, recursos e resultados de aprendizagem.
Prevista para ocorrer a cada dois anos, a avaliação terá o propósito fornecer subsídios para o planejamento de políticas públicas.
A Campanha, no posicionamento divulgado, classificou a retirada da palavra ‘Sistema' do texto aprovado na Câmara como um retrocesso ao avanço proposto pelo Sinaeb (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica), prevista na Lei nº 13.005, que instituiu o atual PNE.
Segundo a entidade, o Sinaeb incorpora dimensões como qualidade, equidade, condições de oferta e contextos territoriais, por exemplo, o que amplia o conceito de avaliações para além dos testes padronizados.
Para o ensino superior, o PLP diz que os padrões de qualidade da etapa serão referência para a autorização de funcionamento de instituições e oferta de cursos, além de integrar a Avaliação Nacional da Educação Superior no nível de graduação.
Segundo matéria publicada na Agência Senado, outra proposta do PLP é que sejam realizadas avaliações nacionais próprias pela União, para nível de graduação e pós-graduação stricto sensu, que serão a base para regulação do MEC.
Segundo a matéria do O Globo citada acima, universidades e institutos de ensino apontam para o risco de perda de autonomia na proposta do SNE. Representantes do setor defendem, portanto, que o SNE seja aplicado apenas para a educação básica.
A entidade também defende que a definição do padrão mínimo de qualidade considere indicadores de acesso, permanência e aprendizagem, o dinamismo das evidências e o contexto educacional brasileiro.
Na segunda passagem pelo Senado, o PLP foi relatado pela senadora Professora Dorinha Seabra (União-TO), que resgatou alguns pontos retirados do texto original ao passar pela Câmara dos Deputados, segundo matéria da Agência Senado.
Entre os trechos retomados, que abordam temas como a educação de pessoas em situação de vulnerabilidade e a modalidade de educação em tempo integral, estão possíveis caminhos para o desenvolvimento de reportagens.
Um dos pontos restituídos foi a colocação do acompanhamento da implementação da BNCC (Base Nacional Comum Curricular) como um dos objetivos do SNE. A União também volta a ter como função garantir a oferta, manutenção e desenvolvimento da educação escolar das populações do campo e comunidades indígenas e quilombolas.
Outros dois trechos resgatados garantem que os Conselhos de Educação tenham autonomia técnico-pedagógica, administrativa e financeira aos Conselhos de Educação e a ampliação progressiva da modalidade de Educação em Tempo Integral.
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