A situação financeira das universidades federais, em um cenário de cortes orçamentários foi tema do webinário “Universidades federais: crise financeira e perspectivas realizado pela Jeduca.
O evento online teve participação do presidente da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior), Edward Madureira Brasil, do especialista em ensino superior Simon Schwartzman, que é membro da Academia Brasileira de Ciências, e do jornalista Bruno Vinícius da Silva, co-autor da série de reportagens “Efeito Desmonte”, publicada na Agência Retruco e contemplada com bolsa no 2.º Edital de Jornalismo de Educação da Jeduca e Itaú Social.
Além de abordar o atual cenário de enxugamento do orçamento e dos repasses de recursos para as despesas não obrigatórias, o webinário enfocou questões de fundo, como a estrutura do sistema de educação superior brasileira e suas relações com o financiamento dessas instituições.
As 69 universidades federais compõem o maior sistema público de ensino superior do Brasil, atendendo a cerca de 1,3 milhão de estudantes considerando graduação e pós-graduação. Em 2021, o sistema sofreu um corte de cerca de 18% em relação ao ano passado, chegando a R$ 4,3 bilhões. Desse total, o MEC (Ministério da Educação) ainda precisa liberar R$ 789 milhões (17% do total). Os cortes, segundo a Andifes, vem ocorrendo nos úlimos anos.
No entanto, mesmo se o valor total previsto no orçamento for liberado, os recursos não são suficientes, alega a Andifes. Por isso, 30 das 69 federais declaram que podem interromper aulas, atendimentos em hospitais universitários e até pesquisas antes do fim do ano, por falta de recursos para manter a infraestrutura funcionando.
Esse cenário merece atenção da cobertura de educação pelo impacto que um eventual fechamento dessas instituições pode ter vem várias dimensões que abarcam desde o desenvolvimento de pesquisas até a vida dos estudantes mais vulneráveis, que dependem de serviços mantidos pelas universidades (como os restaurantes universitários) e de bolsas de assistência estudantil, que geralmente são pagas com recursos do orçamento para despesas não obrigatórias.
Vale lembrar que as federais desempenham um papel relevante na inclusão de estudantes de baixa renda, num contexto em que o país ainda enfrenta o desafio de ampliar o acesso ao ensino superior.
Alguns dados de contexto:
- A Meta 12 do PNE (Plano Nacional de Educação) estabelece que até 2024, 33% dos jovens de 18 a 24 anos devem estar no ensino superior. Em 2020 – apenas quatro anos antes do término da vigência do PNE – 23,4% da faixa etária estava matriculada neste nível de ensino.
- A mais recente pesquisa de perfil do alunado de graduação das federais, divulgada pela Andifes em 2019, aponta que 64,7% dos estudantes de graduação dessas instituições são egressos da rede pública. O dado se refere a 2018.
- O mesmo estudo mostra que 70,2% dos alunos de graduação das federais são de baixa renda, com renda familiar mensal per capita de até 1,5 salário mínimo. Em 2003, eles eram 42,3%.
- Também de acordo com a pesquisa, a maioria dos estudantes é negra (51,2%) do total, porcentagem três vezes maior do que em 2003.
Os resultados da pesquisa pode ser conferidos neste vídeo e no relatório.
Com base no webinário, destacamos alguns pontos de atenção para a cobertura:
- A maior parte das universidades federais está funcionando em regime de ensino remoto por causa da pandemia de Covid-19, mas uma possível pauta é verificar em que medida os atuais cortes podem impactar a preparação para o retorno presencial – que fica mais próximo à medida que a vacinação avançar.
- Outro tema que pode render pautas é o impacto dos cortes sobre os alunos que dependem de auxílios estudantis para se manter nas universidades.
- Vale acompanhar a situação financeira das universidades federais, não como um todo, mas localmente. Como as universidades têm autonomia, cada uma pode gerenciar seus recursos conforme suas necessidades, o que faz com que os arranjos financeiros variem significativamente entre as instituições.
- As universidades federais são muito diversas entre si. Há instituições muito grandes e antigas, como por exemplo, a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) que atende mais de 50 mil alunos só na graduação, e instituições muito novas, ainda em processo de consolidação, como é o caso da Ufape (Universidade Federal do Agreste Pernambucano), criada em 2019. Então, é importante sempre levar em conta as características de cada instituição – não dá para usar os mesmos critérios para entre instituições tão distintas para analisar produção científica, desempenho nos indicadores de qualidade, número de alunos, entre outros aspectos.
- Um aspecto de fundo, abordado no webinário, é o modelo de ensino superior no Brasil, como um fator que pode interferir no montante de recursos disponíveis. A tese é que poderia haver diversificação da estrutura das instituições (o regime de contratação de docentes, por exemplo), o que otimizaria o uso dos recursos e poderia evitar situações de estrangulamento como a atual. Em contrapartida, os defensores do atual modelo afirmam que as federais, tal como são, têm impactos importantes no desenvolvimento local e na formação de pessoal e para a descentralização da produção de pesquisa no país.
Assista ao webinário: