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Cobertura deve focar em histórias, não na "barulheira política"

LynNell Hancock, da Universidade de Columbia, conta que as pautas típicas da educação estão voltando a conquistar espaço, no contexto do governo Trump

21/08/2019
Mariana Mandelli, Especial para a Jeduca

Os contextos políticos dos Estados Unidos e do Brasil vêm sendo comparados repetidamente desde a eleição do presidente Jair Bolsonaro, no ano passado, especialmente pelas semelhanças de sua campanha eleitoral com a de Donald Trump e pelo modo como os dois chefes do Executivo se relacionam com a imprensa.

 

Para LynNell Hancock, professora da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia (EUA), o jornalismo brasileiro pode aprender com os erros cometidos pela imprensa norte-americana, uma vez que Trump foi eleito dois anos antes do político do PSL (Partido Social Liberal). Ela participou do 3.º Congresso Internacional de Jornalismo de Educação da Jeduca, em uma conversa com o jornalista Fábio Takahashi, vice-presidente da associação e editor do DeltaFolha (grupo de jornalismo de dados da Folha de S. Paulo).

 

LynNell conta que houve um “pânico inicial” com a nomeação de Betsy DeVos para a pasta equivalente ao MEC (Ministério da Educação) nos Estados Unidos. “Os repórteres cobriram bem a atuação dela - uma mulher rica, cristã e evangélica -, discutindo sua proposta de dar vale para crianças frequentarem escolas particulares religiosas”, explicou. “Ela entrou com a missão de privatizar as escolas públicas, o que causou um certo temor.  Se Trump tivesse apoiado esse movimento, teríamos outro contexto.  Como isso não ocorreu, o máximo que ela conseguiu foi suspender algumas medidas de [Barack] Obama relativas a empréstimos estudantis e à proteção de crianças transgêneros”.

 

Na opinião da professora de Columbia, notícias importantes foram ignoradas enquanto a imprensa dava ênfase a boatos e tweets. No entanto, esse cenário melhorou recentemente, pois os jornalistas voltaram a se concentrar em temas da educação, como currículos escolares, que não ganhavam projeção há mais de uma década. “O jornalismo de educação conseguiu reassumir o protagonismo do que é notícia e da cobertura”, comentou.

 

“Devemos utilizar tudo que conseguimos como jornalistas para tentar publicar as histórias que chamem atenção para a área da educação, por mais difícil que seja isso em momentos de ‘barulheira política’”, reforçou LynNell.

 

Crise local

De acordo com LynNell, os EUA vivem uma fase de “desertos jornalísticos”: diversos estados não possuem mais nenhum veículo de imprensa local. Ou seja: os habitantes de centenas de cidades estadunidenses não têm conhecimento do que acontece em suas próprias comunidades, ficando à mercê das redes nacionais de televisão e dos canais a cabo, que muitas vezes apresentam conteúdo político questionável.

 

“O maior perigo do jornalismo de educação está relacionado à morte das notícias locais – esta é uma crise nacional que coloca nossa democracia em risco”, alertou, citando iniciativas como a do New York Times de voltar a investir nesse tipo de cobertura. “Nos Estados Unidos, grande parte da cobertura de educação é local e ela acaba sendo muito afetada”.

 

Ela também criticou o jornalismo declaratório, debatido na mesa de abertura do Congresso da Jeduca. Mas reconheceu que, apesar de haver um entendimento entre os jornalistas de que esse não seja necessariamente um bom caminho, a prática ainda é largamente usada nas grandes redações. “Esse é o maior erro que podemos cometer como jornalistas porque estamos dando plataforma a esse show, e não à substância, ao debate. E ele [Trump] é habilidoso em capturar a atenção”, pontuou LynNell.

 

O MEC e a disputa política

A contaminação das pautas de educação por questões ideológicas, deixando de fora da cobertura temas referentes às políticas públicas, também foi central na discussão da mesa anterior à de LynNell, “Governo x jornalismo: a cobertura do MEC”, sobre o trabalho da imprensa de educação durante os primeiros meses do governo Bolsonaro. Mediada por Renata Cafardo, repórter especial e colunista do O Estado de S. Paulo, a discussão entre os jornalistas de diferentes veículos enfatizou o fato de o Ministério da Educação ter ganhado um caráter mais político, extrapolando as pautas educacionais.

 

“O primeiro choque é como tratar com os dois os dois ministros que passaram por lá [Ricardo Vélez, demitido em abril, e o atual Abraham Weintraub], que não são criados em partidos e não têm vivência político-partidária. Eles não veem a política como estamos acostumados a ver”, disse Caio Junqueira, repórter da revista Crusoé. Outro aspecto, na visão de Junqueira, é que na atual gestão o MEC é uma pasta estratégica para o projeto político do governo. “Como se trata de um ministério com carga ideológica forte, ele passou a ser objeto de disputa dentro do governo”, completou ele, dizendo que Weintraub é um “representante do clã Bolsonaro” dentro da pasta da educação, pois é totalmente alinhado com a ala ideológica do governo e com os valores da família do presidente.

 

A jornalista Eliane Cantanhêde, colunista do Estado de São Paulo e comentarista da GloboNews, também presente à mesa, concorda. “Vélez e Weintraub são o mesmo ente. Eles não são eles, são personas de um mesmo sistema, de uma mesma crença política”, afirmou.

 

Para ela, a polarização política que permeia o país e, consequentemente, a cobertura jornalística de educação, também pode ser imputada à imprensa. “Não cumprimos nosso papel de discutir diretamente as questões que interessam à população nos últimos anos. Além disso, há uma desqualificação da política no trabalho jornalístico. Massificamos a ideia de que todo mundo é igual, todo mundo é ladrão e não discutimos o que realmente é importante”, analisou a jornalista.

 

Os obstáculos para a cobertura do MEC, como a falta de acesso às fontes oficiais e os sucessivos ataques de Bolsonaro à imprensa, também foram abordados pelos repórteres. Para eles, há uma exigência cada vez maior de que o jornalista tenha um amplo conhecimento do contexto político para atuar em uma editoria específica. “Hoje, você não cobre só educação. Um bom jornalista de educação sabe que está dentro de um contexto político ao passo que esse tema sai do nicho e ganha espaço nas colunas de opinião e economia, por exemplo”, completou Cantanhêde.

 

Essa capilaridade dos assuntos educacionais pode ser vista de forma positiva, segundo o repórter do Valor Econômico Hugo Passarelli. “Percebemos que a nossa cobertura está saindo da editoria de educação. Recentemente tive que explicar o motivo de o Valor estar falando de educação”, contou.

 

Novos formatos

A pulverização da pauta educacional por outras editorias também surgiu como tema no debate mediado por Leandro Beguoci, diretor editorial e de produtos da Nova Escola. Para ele, nunca se falou e debateu tanto educação como nos últimos meses, o que pode ser visto como uma oportunidade de produção de conteúdo em novos formatos que explorem, por exemplo, o jornalismo explicativo, que se dedica a dissecar um mesmo assunto de maneira mais analítica e aprofundada.

 

Ele foi o mediador da mesa “Novas formas de mostrar o nosso trabalho e a ascensão do podcast”, que contou com a participação de Magê Flores, apresentadora do podcast Café da Manhã na Folha de S.Paulo, e Sam Stewart, jornalista independente e especialista de mídia.

 

Para Magê, o podcast é um exemplo de plafatorma voltada para o jornalismo explicativo, uma vez que permite uma curadoria de conteúdo. “O jornalismo está em um momento de mostrar a que veio, já que estava acostumado a ser autoridade em informação, entregando diariamente um pacote dela e dizendo ‘confie em mim’. No podcast, você consegue mostrar também quem está por trás daquele trabalho, com as sutilezas da personalidade do jornalista”, pontuou.

 

O jornalista norte-americano Stewart afirmou que as redações precisam pensar no espaço e na profundidade que o espaço digital permite em detrimento das barreiras dos veículos impressos. “Temos formas robustas de simplificar visualizações de dados para o jornalista explicar o que quer e para o público entender o que ele quer dizer”, afirmou ele, que estuda desinformação em imagens.

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