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Marcos Oliveira/Agência Senado

Entenda o que está em jogo no debate sobre o piso da educação

Discussão entre defensores e opositores da vinculação orçamentária para a área foi desencadeada pela PEC emergencial, que prevê a extinção do mecanismo

01/03/2021
Marta Avancini

(Atualizado em 2/3/2021)

 

Nesta terça (2/3), está previsto o debate da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) emergencial,  a PEC 186/2019, no Senado que, conforme indicam as notícias, deverá ser apresentada sem a eliminação dos pisos constitucionais para gastos com educação e saúde.

 

A Constituição de 1988, no artigo 212, define que a União tem que aplicar no mínimo 18% da arrecadação na educação, e os estados e municípios, 25%. No guia "Financiamento da Educação Básica", da Jeduca, a estrutura do financiamento da educação brasileira é explicada em detalhe.

 

O fim da vinculação de uma parcela da arrecadação de impostos nessas áreas foi incluída no relatório da PEC emergencial apresentado pelo senador Marcio Bittar (MDB-AC) na semana passada. Segundo reportagem da Folha de S.Paulo, desde 1934, somente em governos autoritários houve a derrubada da vinculação de recursos para a educação.

 

Com a divulgação do teor do relatório preliminar pelo site Congresso em Foco, diversos movimentos e organizações sociais se pronunciaram contrariamente à medida: a Campanha Nacional pelo Direito à Educação e a Fineduca (Associação Nacional de Pesquisa em Educação) divulgaram nota técnica sobre o tema. O Todos pela Educação também divulgou uma nota alertando para os riscos da proposta. Undime e Consed, que representam, respectivamente, os dirigentes municipais e estaduais de educação, também divulgaram textos, repudiando a iniciativa (leia aqui e aqui).

 

Um grupo de mais de 60 organizações e entidades da educação, lideradas pela SBPC (Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência), se manifestaram contra a proposta. Também falaram contra a desvinculação governadores do Nordeste e as Frentes Parlamentares Mistas da Primeira Infância, Saúde e Educação, entre outros (leia aqui e aqui).

 

A resistência desencadeada pela ideia – inclusive entre os próprios senadores – inviabilizou a leitura do documento durante a sessão da última quinta-feira. Diante da resistência, Bittar anunciou que vai retirar a proposta do relatório.

 

 

 

Direitos e impactos

A proposta de desvinculação dos recursos para a educação e a saúde tem aparecido com frequência nos debates e toca sempre em questões complexas sobre o financiamento da educação, como o nível adequado de investimento público e sua eficiência. A relação entre o aumento de gastos públicos e o impacto na qualidade do ensino é um dos tópicos de grande debate no meio acadêmico, não apenas no Brasil. 

 

É, sem dúvida, uma medida com significativos impactos no setor educacional. A vinculação é defendida por ser um mecanismo para assegurar esses direitos e para o planejamento das ações nos estados e municípios. A nota do Todos pela Educação alerta que a desvinculação, se aprovada, altera o contexto orçamentário da educação brasileira, podendo causar a redução dos gastos públicos com educação.

 

Segundo o documento da Campanha e da Fineduca, a queda do montante para a educação pode ser de R$ 95,7 bilhões, o que reduziria pela metade o valor por aluno da educação básica.

 

Os defensores da desvinculação - articulada com o governo federal – dizem que ela  garantiria mais flexibilidade a estados e municípios, como declarou o diretor de Programas do Ministério da Economia, Bruno Funchal, em entrevista à CNN.

 

Outro argumento usado pelos defensores da desvinculação é que não há evidências de que os investimentos em educação revertem em melhoria da qualidade. Por isso, por exemplo,  alguns economistas querem a definição de um valor nominal corrigido pela inflação no lugar do piso constitucional.

 

Nesse sentido, um estudo do TCU (Tribunal de Contas da União) aponta para uma  correlação entre investimento em educação e melhoria dos indicadores.

 

No debate, há também outras linhas de argumentação, como a de que, se a opção for pela desvinculação, ela não pode ser feita abruptamente, pois seria um processo complexo, que envolve regras e processos de transição.

 

Um debate em curso

O anúncio da mudança do relatório feita pelo senador, porém, não esgota o debate. Antes de tudo, porque somente com a apresentação do novo relatório será possível ter a certeza de que a vinculação foi mantida.  O Estadão noticiou no sábado, 27/2, dois dias depois da sessão do Senado em que a leitura do relatório de Bittar foi suspensa, que o governo pretende insistir na ideia de tirar o piso da educação e da saúde.

 

Além disso, existem outros aspectos da PEC que podem mexer com o montante destinado à educação e à saúde, como a unificação dos pisos para as duas áreas, que chegou a ser mencionada na semana passada.

 

A unificação dos pisos, além de criar um ambiente de instabilidade financeira, pode gerar uma disputa entre a saúde e a educação por recursos, ainda mais em um contexto de pandemia. Segundo estudo do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), nesse cenário, a área da educação tende a ser mais prejudicada.

 

Outro ponto do relatório de Bittar – cuja retirada não está em questão – e que pode mexer com os recursos para a educação é a proposta de alteração do Artigo 6 da Constituição, que aborda os direitos sociais (educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados).

 

O texto do senador fala em “direito ao equilíbrio fiscal intergeracional”, o que significa que os direitos sociais passariam a ser condicionados aos limites orçamentários fiscais, a fim de não gerarem pressão orçamentária para as gerações futuras, conforme explicação da Nota Técnica da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e Fineduca (Associação Nacional de Pesquisa em Educação). O site GGN também publicou uma análise desse ponto do relatório da PEC emergencial.

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