(Atualizado em 13/6/2023)
Com apuração de Isabella Siqueira)
O MEC (Ministério da Educação) apresentou no dia 12/6 o Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, que tem como meta alfabetizar 100% das crianças do 2º ano do ensino fundamental até 2026. Para isso, a promessa é investir R$ 3 bilhões nos proximos quatro anos nas cinco frentes que constituem a nova política: gestão e governança, formação, infraestrutura física e pedagógica, reconhecimento de boas práticas e sistema de avaliação.
Uma das bases do Compromisso é a pesquisa Alfabetiza Brasil, realizada com professores com o objetivo de recolher elementos para dar suporte às políticas de avaliação da alfabetização. Com base na pesquisa, o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) definiu critérios e uma pontuação de corte na escala do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica) para caracterizar uma criança alfabetizada. Saiba mais nesta matéria da Jeduca.
A nova politica de alfabetização se estrutura na cooperação entre União, estados e municípios, a exemplo de outras políticas recentes, como detalhado mais adiante.
Algumas entidades se manifestaram em relação ao Compromisso, como a CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação) e a Rede Latino-Americana de Alfabetização.
Para contribuir com a cobertura da nova política de alfabetização, a Jeduca reuniu informações sobre algumas das principais políticas e programas voltados para a alfabetização no período recente.
PNA (Política Nacional de Alfabetização)
A PNA foi instituída por decreto (9.765/2019) no primeiro ano do governo Bolsonaro. Baseada nas ciências cognitivas (estudo da mente humana), a PNA propõe uma abordagem da alfabetização baseada em evidências nesta área do conhecimento.
Ela foi criticada por atores do campo da educação por enfatizar um único método de alfabetização, o método fônico, baseado na associação entre som e escrita - perspectiva que não é consensual na área.
A PNA propõe um trabalho colaborativo de famílias, professores, escolas, redes de ensino e poder público, com ênfase no papel da família - outro ponto que despertou debate em torno da proposta.
Também gerou debate a produção de material de alfabetização para crianças de pré-escola, fase em que, segundo uma linha de pesquisadores da primeira infância, não é recomendável promover a alfabetização formal.
A PNA foi implementada por meio do programa Tempo de Aprender, a partir de adesão de estados e municípios e se estruturou em quatro eixos: formação continuada de professores, apoio pedagógico para alfabetização, aprimoramento das avaliações e valorização dos profissionais.
Avaliação do programa realizada a pedido do MEC indica que houve melhoria da fluência de leitura de estudantes do 2º ano.
Programa Mais Alfabetização
Em 2018, no governo Temer, foi criado o Programa Mais Alfabetização com o objetivo de reverter “estagnação na aprendizagem” revelada pela ANA (Avaliação Nacional da Avaliação): 54,73% dos estudantes com mais de 8 anos tinham níveis considerados insuficientes de leitura em 2016 (último ano em que a avaliação foi realizada). Em 2014 eram 56,1%.
No lançamento, o MEC anunciou investimento de R$ 523 milhões em dois anos para os municípios implementarem ações, que posteriormente seriam avaliadas. Uma das medidas previstas no programa é o assistente de alfabetização para atuar em conjunto com o professor de sala. Inicialmente, 49 mil escolas aderiram ao programa.
PNAIC (Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa)
Instituído em 2012, no governo Dilma, o Pnaic (Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa) baseia-se num compromisso assumido por governo federal, estados e municípios para assegurar a alfabetização de todas as crianças no 3º ano do ensino fundamental.
A iniciativa foi inspirada no PAIC (Programa Alfabetização na Idade Certa), implementado em 2007 no Ceará, por meio de cooperação entre o estado e os municípios.
Juntamente com o PNAIC foi criada a ANA (Avaliação Nacional de Alfabetização). A ANA foi realizada em 2014 e 2016. Em 2019, a ANA foi integrada ao Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica).
O PNAIC se estrutura na cooperação entre os três níveis de governo e se baseia em quatro eixos principais: a formação continuada de professores alfabetizadores; materiais didáticos e pedagógicos; avaliações; e gestão, controle social e mobilização. A formação era realizada por universidades públicas.
Pontos de atenção para a cobertura
A questão do método
Muitas vezes, o debate sobre o sucesso ou o fracasso das políticas de alfabetização centra-se no método adotado - esse debate ganhou força, por exemplo, na época da PNA.
No entanto, professores alfabetizadores e pesquisadores apontam que a continuidade das ações tem mais impacto do que o método adotado, até porque professores relatam que utilizam elementos de referências teóricas diferentes no processo de alfabetização.
Outro aspecto importante - e que merece atenção - é que a alfabetização envolve conhecimentos linguísticos e psicológicos sobre a aprendizagem (psicogênese da língua escrita, sobre psicologia cognitiva e sobre pscicologia do desenvolvimento), entre outros conhecimentos e habilidades. Por isso, nessa cobertura, vale enfocar e detalhar as ações de formação docente previstas, a maneira como são implementadas e como elas se vinculam à realidade das escolas. Vale também ouvir professores, além de conhecer como eles trabalham em sala de aula e suas condições de trabalho.
Continuidade e ruptura de políticas
No prazo de aproximadamente uma década, o Brasil teve três políticas diferentes no campo da alfabetização. Essas rupturas vão na contramão de experiências e de políticas que, em função de serem duradouras, produzem resultados positivos na aprendizagem, na redução do abandono e da evasão e na qualidade da oferta de ensino.
No âmbito das políticas de alfabetização, um exemplo é o PAIC, em funcionamento no Ceará desde 2007. O programa é apontado como responsável pelos bons indicadores do estado no Saeb e no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), porque a melhoria dos resultados na alfabetização gerou impacto positivo na trajetória escolar dos estudantes - eles passaram a ter melhor desempenho no ensino fundamental e até no ensino médio.
As experiências de Sobral e a do Ceará, embora tenham gerado melhora dos indicadores e se tornado referência, são vistas com ressalvas por setores da pesquisa em educação, porque se orientarem, na visão deles, por uma lógica de busca de resultados pautados por avaliações externas, vinculadas a sistemas de prestação de contas e responsabilização.
Existem outras experiências reconhecidas como bem sucedidas em alfabetização, como é o caso do município de Lagoa Santa (MG), onde a secretaria municipal de Educação fez uma parceria com a educadora e pesquisadora Magda Soares - que foi ligada à UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e é reconhecida como um dos principais nomes no campo da alfabetização no país.
É importante ter em mente essa dinâmica e buscar, na apuração, identificar e compreender aspectos que favorecem a continuidade das políticas públicas, assim como os fatores que levaram à substituição de uma política por outra. Assim como é relevante atentar para as características das políticas, compreendendo seus pontos positivos e os desafios que as permeiam.
Modelo de gestão e cooperação
As três políticas nacionais recentes no campo da alfabetização basearam-se em um modelo de cooperação entre governo federal, estados e municípios.
Em relação a este aspecto, vale detalhar como será, na prática, a distribuição de responsabilidades e como a nova política vai se alinhar com iniciativas que já existem em vários estados e municípios. Também pode ser interessante identificar o que deu certo e o que não deu nas iniciativas anteriores.