Quais são os temas da educação mais comuns nos programas de governo? Como identificar se as promessas dos candidatos são condizentes com as responsabilidades dos municípios? E como fugir do jornalismo declaratório na cobertura das campanhas eleitorais?
Esses foram alguns dos assuntos debatidos no webinário A educação nos planos de governo e como identificar fontes confiáveis, realizado pela Jeduca, no dia 24 de julho.
O evento, que contou com participação dos jornalistas Rodrigo Ratier (USP) e Daniel Nardin (Amazônia Vox), encerrou a série A cobertura de educação e as eleições 2024. A jornalista Marta Avancini, editora pública da Jeduca, fez a mediação.
Em sua apresentação, Rodrigo Ratier listou seis temas que podem aparecer nos planos de governo das candidatas e candidatos à prefeitura: acesso à educação, permanência, democratização da gestão, carreira docente, garantia do piso salarial dos professores, qualidade do ensino e financiamento.
“O primeiro ponto é ficar atento à relação entre as propostas dos candidatos com a legislação vigente”, destacou Ratier. Ou seja, vale verificar se as promessas de campanha estão de acordo com a legislação e normas educacionais (LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, PNE – Plano Nacional de Educação e BNCC – Base Nacional Comum Curricular, entre outras leis). “Pela constituição, as prefeituras precisam aplicar no mínimo 25% do que arrecadam em educação. É importante ter esse tipo de informação no horizonte”, exemplificou Ratier, referindo-se às vinculações constitucionais.
Com relação ao acesso à educação, ele citou a Emenda Constitucional 59, que estabelece a obrigatoriedade de matrícula na escola dos 4 aos 17 anos. Na permanência, o jornalista lembrou a importância do poder público adotar medidas que contribuam para que as crianças e adolescentes permaneçam na escola. “Os planos de governo devem contemplar essa dimensão. No caso da creche, uma ação de apoio às mães, às famílias, pode favorecer a permanência”, exemplificou.
O piso salarial dos professores é outro assunto que pode render pauta no contexto das campanhas eleitorais, já que muitos municípios não cumprem esta lei. A lei do piso estabelece o mínimo que deve ser pago a professores da rede pública para jornadas de, no máximo, 40 horas semanais. Anualmente, o valor é reajustado e vale para todo o país, para União, estados, Distrito Federal e municípios.
A autonomia das escolas, um dos princípios da legislação educacional brasileira, é outro ponto que, na opinião de Ratier, merece atenção. Segundo ele, vale acompanhar se as escolas estão, de fato, atuando como espaços de construção e integração cultural, como prevê a legislação.
Ratier falou também sobre fontes, destacando a importância de buscar alternativas para fugir do jornalismo declaratório. Um caminho, segundo ele, é recorrer a especialistas e ao que ele chama de “fontes testemunhais” (professores, estudantes, famílias que vivem o dia a dia da escola e da educação). Dessa forma, o jornalista pode reunir elementos para contextualizar e confrontar, se for o caso, propostas e declarações de candidatos.
O jornalista Daniel Nardin chamou a atenção, em sua fala, para a importância do papel do jornalismo, num cenário em que as redes sociais têm se tornado a principal fonte de informação das pessoas.
“É preciso tomar cuidado com políticos que estão mais preocupados em fazer selfie do que se aprofundar nos projetos. Muitos veem a chance de crescer nas redes sociais de forma independente da mídia tradicional e chegar direto ao eleitor”, pontua Nardin.
Em contrapartida, os próprios veículos, na busca de aumentar a audiência, podem reproduzir declarações sem fundamento de candidatos e acabam dando visibilidade a discursos produzidos deliberadamente para conseguir repercussão nas redes e que nem sempre são verdadeiros.
“O jornalismo é essencial nesse contexto. O papel do jornalista não é só reproduzir o que o candidato disse, mas checar, confrontar as informações, mostrando se o que ele disse faz sentido”, defende o jornalista.
No entanto, ao consultar um especialista, é importante ter clareza de qual é a perspectiva dele e se não é vinculado a um ou outro candidato. “É preciso tomar cuidado para que a fala de um especialista não esteja carregada para atacar um candidato e favorecer outro”.
Outro ponto de atenção, enfatizado por Nardin, é o plano de governo. “É importante estudar o plano de governo dos candidatos e buscar fontes que digam se as propostas são ou não factíveis. As promessas têm respaldo? Existe demanda? De onde virá o financiamento?”, questiona ele. Além das entrevistas com especialistas, um caminho pode ser consultar bases de dados públicos como as do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) e do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O site da Jeduca possui uma área que dá acesso a diversas bases de dados sobre educação.
Além de analisar as promessas e propostas, também é importante se atentar aos nomes cotados para assumir as secretarias. Como lembrou o jornalista, a qualidade das equipes técnicas, especialmente numa secretaria como a de educação, faz diferença.
Assista ao webinário:
Assista também aos outros três webinários da série A cobertura de educação e as eleições 2024, sobre o uso da educação em conteúdos de desinformação, acesso da educação de qualidade e o desenvolvimento infantil e sobre os desafios dos anos iniciais do ensino fundamental.
Para saber mais
Legislação sobre educação
LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional)
PNE (Plano Nacional de Educação) 2014-2024
BNCC (Base Nacional Comum Curricular)
Bases de dados sobre educação
Indicadores eduacionais do Inep
Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica) do Inep
Planos de governo
Divulgação de candidaturas e contas eleitorais (Eleições 2024)