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Acesso e aprendizagem no ensino fundamental são temas de atenção na cobertura das eleições

No terceiro webinário da série promovida pela Jeduca, especialistas e jornalistas delinearam os principais desafios da etapa para os gestores municipais

23/07/2024
Redação Jeduca

(Com apuração de Isabella Siqueira)

 

Uma das atribuições dos municípios no campo da educação é ofertar o ensino fundamental, por isso na cobertura das campanhas eleitorais de 2024, é importante acompanhar como o tema aparecerá nos programas de governos e propostas dos candidatos. 

 

No webinário Desafios dos anos iniciais do ensino fundamental, promovido pela Jeduca no dia 17 de julho, Cleuza Repulho (FGV-RJ), Mônica Dias Pinto (Unicef) e Vinicius de Oliveira (Porvir) debateram sobre alguns pontos relevantes para as políticas educacionais desta etapa e que podem se desdobrar em pautas. A mediação foi de Marta Avancini, editora pública da Jeduca.

 

Em sua apresentação, Cleuza chamou a atenção para o fato de que ainda há direitos não assegurados, como o acesso ao ensino fundamental. “A gente tem a impressão que o fundamental está resolvido, mas não é verdade”, afirma a consultora, lembrando que em muitas localidades não é cumprida a lei, que estabelece a matrícula obrigatória dos 4 aos 17 anos. 

 

“Há prefeitos que não conhecem essa legislação e imaginam que o ensino obrigatório é a partir dos 7 anos. E mesmo em grandes cidades, há crianças de 4 e 5 anos fora da escola e outras que começam o fundamental depois dos 6 anos. Em cidades grandes, isso geralmente acontece por falta de transporte”, relata ela.

 

Outro fator que pode dificultar ou impedir o acesso à escola, levando ao abandono e à evasão é a falta de articulação entre as políticas educacionais com as áreas da saúde e assistência, destacou Mônica Dias Pinto, oficial de Educação do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância). 

 

Segundo ela, há 156 mil crianças de 6 a 10 anos (faixa etária dos anos iniciais do fundamental) fora da escola no Brasil, segundo dados do programa Busca Ativa Escolar, mantido pelo Unicef e Undime (União dos Dirigentes Municipais de Educação).  

 

“Muitas vezes, as crianças estão infrequentes porque faltam políticas de saúde e assistência de apoio às famílias”, analisa Mônica, referindo-se, por exemplo, a situações de violência, questões graves de saúde na família, extrema pobreza, entre outras. “Os jornalistas podem verificar se os programas dos candidatos incluem a busca ativa”, sugere.

 

Financiamento e recursos disponíveis

Além da garantia do direito das crianças à educação, outro ponto de atenção à cobertura é o financiamento. “É preciso ficar atento se o gestor conhece como funciona o financiamento da educação”, alerta Cleuza. “Existem linhas de financiamento para todos os municípios do Brasil. Não é só o município rico que tem dinheiro. Municípios pobres e prioritários têm direito a receber recursos que podem ser direcionados para o ensino fundamental”, complementa Cleuza, referindo-se ao Compromisso Nacional Criança Alfabetizada e ao Fundeb (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação).

 

No Fundeb, por exemplo, além do VAAF (Valor Aluno Ano), pago por estudante matriculado, há também o VAAT (Valor Aluno Ano Total), complementação destinada a redes que não alcançam o valor mínimo por aluno, e o VAAR (Valor Aluno Ano Resultado),  que dá mais recursos para redes que melhoram os indicadores de matrícula e aprendizagem, com redução de desigualdades.

 

Nesse sentido, Mônica chamou a atenção para o Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, que conta com R$ 1 bilhão para serem usados para assegurar a alfabetização das crianças até o final do 2º ano do ensino fundamental. O dinheiro está disponível para formação de professores, criação de cantinhos de leitura nas salas de aula, materiais pedagógicos, avaliações, entre outras ações. Quem está na cobertura pode, então, monitorar se esse recurso está chegando ao município e como está sendo usado.

 

Ainda em relação ao Compromisso, Mônica chamou a atenção para a portaria 506/2024 do MEC (Ministério da Educação), que prevê ações complementares para assegurar a alfabetização na idade certa de crianças com deficiência, indígenas, quilombolas e que vivem no campo. 

 

Outro ponto de atenção, para a oficial do Unicef, é o Pacto Nacional pela Recomposição das Aprendizagens para apoiar os estudantes em defasagem por causa dos efeitos da pandemia de covid-19. “É importante acompanhar se os municípios e estados vão aderir”, alerta Mônica, acrescentando que o pacto também se aplica para situações de emergência climática, como as secas na região Norte e os recentes alagamentos no Rio Grande do Sul.

 

O papel do jornalismo

Num cenário em que os municípios são os responsáveis pela implementação de muitas  políticas educacionais, o jornalista Vinícius de Oliveira, editor do site Porvir, chamou a atenção para a distância que muitas vezes existe entre o desenho das políticas públicas e o que é compreendido pelos diretores e educadores. 

 

“O nosso trabalho funciona como uma tradução das políticas públicas”, analisa ele. “De maneira geral, as coberturas jornalísticas reagem aos problemas e se mostram pouco propositivas. Mas é possível destacar exemplos de escolas que reagem, acolhem e ensinam de uma maneira diferente”, continua o jornalista, referindo-se à cobertura de temas como os efeitos da pandemia e da crise climática na educação.

 

Para ele, nesses casos, fica evidente a reconfiguração do papel da escola, e o jornalista precisa estar preparado para tratar desses temas em reportagens. Nesse sentido, Oliveira chama a atenção para a importância de estar atento às especificidades locais. “Não é possível usar a mesma régua para todas as coberturas, para todas as localidades, porque os contextos são muito diferenciados”, concluiu.

Assista ao webinário completo:

 



Este foi o terceiro webinário da série A cobertura de educação nas eleições 2024 (leia aqui). O primeiro webinário da série abordou o uso da educação em conteúdos de desinformação nas campanhas eleitorais (saiba mais aqui), e o segundo o acesso à educação de qualidade e o desenvolvimento infantil. Os eventos fazem parte da série de webiinários A cobertura de edcuação nas eleições 2024 (acesse aqui).

 

Confira, a seguir, dados e sugestões de fontes de informação para

a cobertura sobre ensino fundamental nas campanhas eleitorais



Raio-x dos anos iniciais do ensino fundamental nos municípios

  • Em 2023, o Censo Escolar registrou 26.108.208 matrículas no ensino fundamental. Desse total, 14.426.650 são alunos dos anos iniciais (1º ao 5º ano), que estudam em 672.292 turmas. Ao todo, o Censo registrou 769.366 docentes nos anos iniciais.

  • A rede municipal é a principal responsável pela oferta dos anos iniciais do ensino fundamental, com 10.027.344 de matrículas em 2023, de acordo com o Censo  Escolar. Com isso, a rede municipal tem uma participação de 69,6% no total de matrículas dos anos iniciais e concentra 86,1% dos alunos da rede pública.

  • Alguns dados sobre recursos disponíveis nas escolas de ensino fundamental (anos iniciais e anos finais):

 

Infraestrutura

Escolas públicas (%)

Escolas municipais (%)

Água filtrada

94

93

Água inexistente

3

3

Sem energia elétrica

3

3

Esgoto inexistente

6

7

Alimentação

100

100

Biblioteca

34

27

Dependências com acessibilidade

65

64

Laboratório de informática

34

25

Sala de leitura

26

24

                                         Fonte: QEdu



  • A taxa de distorção idade-série dos anos iniciais do ensino fundamental foi de 7,5% em 2023; a maior taxa foi registrada no 5º ano (11,5%). Na rede municipal, ela chegou a 8,4%. Os dados são do Indicador de Distorção Idade-Série do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), disponibilizado no QEdu. É possível consultar dados por município e escola no site do Inep.

 

  • De acordo com o 5º Relatório de Monitoramento do Plano Nacional de Educação do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), 95,7% das crianças e adolescentes de 6 a 14 anos frequentam o ensino fundamental -  o menor valor registrado em mais de dez anos (a linha de base do PNE 2014-2024 estimou o indicador em 96,7% em 2012). Em 2019, o Brasil havia alcançado a taxa de 97,8%. A queda é atribuída à crise sanitária da covid-19 e ocorreu principalmente nos anos iniciais do fundamental.

 

Percentual da população de 6 a 14 anos que frequenta
ou já concluiu o ensino fundamental -
Brasil, grandes regiões e unidades da federação -  2023

Brasil/regiões/UFs

2023 (%)

Variação
2012-2023
(pontos percentuais)

Brasil

95,7

-1,0

Norte

95,7

0,0

Rondônia

94,7

-1,7

Acre

94,0

-1,8

Amazonas

96,2

0,0

Roraima

92,0

- 4,5

Pará

96,3

0,7

Amapá

94,6

-1,5

Tocantins

95,1

0,7

Nordeste

95,5

-0,6

Maranhão

95,7

0,8

Piauí

97,1

0,3

Ceará

96,3

-0,7

Rio Grande do Norte

96,2

-0,7

Paraíba

95,0

-1,2

Pernambuco

95,2

-0,4

Alagoas

95,0

-1,0

Sergipe

96,4

0,6

Bahia

95,8

-0,2

Sudeste

95,9

-1,3

Minas Gerais

97,3%

0,3

Espírito Santo

95,8%

-1,4

Rio de Janeiro

94,2%

-1,9

São Paulo

95,8%

-1,9

Sul

95,4%

-2,3

Paraná

94,3%

-3,1

Santa Catarina

95,3%

-3,0

Rio Grande do Sul

96,7%

-0,9

Centro-Oeste

95,5%

-1,1

Mato Grosso do Sul

96,7%

-1,1

Mato Grosso

92,7%

-3,0

Goiás

95,8%

-1,1

Distrito Federal

97,4%

1,3

                                                                       Fonte: 5º Relatório de Monitoramento do Plano Nacional de Educação do Inep.

 

Aprendizagem

  • De acordo com os resultados do Saeb 2021, ao final do segundo ano do ensino fundamental, a taxa de estudantes alfabetizados em língua portuguesa era de 43,6%, o que significa uma queda em comparação a 2019 (60,3%). A diferença é atribuída à pandemia da covid-19.

 

Proficiência média em língua portuguesa
no 2º ano do ensino fundamental -
Saeb 2019 e 2021 - Brasil e grandes regiões

 

2019

2021

Brasil       

750

726

Norte

731

712

Nordeste

741

718

Sudeste

756

731

Sul

762

734

Centro-Oeste

750

724

                                                                                  Fonte: Saeb 2021.

 

  • De acordo com estudo amostral realizado pelo CAEd (Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação) da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora) com estudantes da rede estadual de São Paulo, o impacto da pandemia de covid-19 na aprendizagem foi maior entre os alunos dos anos iniciais do ensino fundamentalEF. 

 

Estudos e publicações

Cenário da exclusão escolar no Brasil - Um alerta sobre os impactos da pandemia de covid-19 na educação, do Unicef e Cenpec. (2021)

 

Entenda como funciona o Indicador Criança Alfabetizada do MEC, material de orientação da Jeduca

Resultados do Saeb e Ideb 2021 exigem cuidado nas comparações, material de orientação da Jeduca

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